Vídeo do Château Tour de Mirambeau: parece propaganda. E é. Mas é bonito.
Os amantes e aficionados do vinho que costumam frequentar feiras – aqueles eventos onde o produtor fica servindo goles de seus rótulos e o público vai enchendo a caneca meio sem critério – manjam a figura: Jean-Louis Despagne. Todo ano lá está ele com sua indefectível gravata borboleta, a barba cerrada e seus Bordeaux para oferecer. Ele e sua família são proprietários de vinícolas desta região mítica da França: como o Château Tour de Mirambeau (importado pela Mistral) e Bel Air (importado pela Decanter).
Bordeuax é aquela região confusa de entender da França de diversas classificações e regiões, dos premier cru classé do Médoc, Graves e Sauternes, dos premier grand cru classé A e B de St. Émilion e dos rótulos míticos que aprendemos a admirar nos livros e cursos mas raramente comprovamos na taça sua glória e fama já que o preço é proibitivo. Estes nomes devem querer dizer alguma coisa para você, não? Château Latour, Château Lafite Rothschild, Château Margaux, Mouton Rothschild e Château Haut-Brion (Médoc), Château Haut-Brion (Graves); Château d’Yquem (Sauternes); Château Angélus, Château Ausone, Château Cheval Blanc e Château Pavie (St. Émilion) e finalmente Château Petrus (Pomerol, que tem fama mas não classificação). Mas já provou algum? Então…
E o Bordeaux tirou a gravata borboleta
Mas há sim rótulos de Bordeaux para os mortais. Mas atenção, muitos deles são ruins, não valem o investimento ou a barganha. Ter a região de Bordeaux gravada em um rótulo não é indicativo de boa procedência, e pode decepcionar. Mas há uma produção de tintos e brancos de excelente nível e preços compatíveis. Tour de Mirambeau é uma de seus melhores representantes. E com isso voltamos ao nosso personagem Jean-Louis Despagne, desta vez sem a gravata borboleta e de barba feita, que veio apresentar os rótulos de sua Bordeaux, da região de Entre-deux-Mers. Não sei se foi o canícula que castiga São Paulo nos últimos tempos ou a proximidade com o Brasil (Despagne visita com frequência o Brasil, em especial Paraty e Trancoso, e fala um português fluente), mas a descontração talvez traduza melhor os seus caldos, que são descomplicados.
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A família Despagne vem cultivando vinhedos por mais de 250 anos. O histórico Château Tour de Mirambeau, localizado em frente a St Emilion, tem cerca de 80 hectares. Começou produzindo mais vinhos brancos, hoje a proporção é 50% para tintos e 50% para brancos, refletindo um pouco o mercado consumidor mundial. Hoje os três filhos de Jean-Louis cuidam da enologia à venda, sendo que a filha, Basaline, é a executiva principal do negócio. Jean-Louis Despagne, como ou sem gravata borboleta, é uma simpatia e com apresentou seus vinhos:
Dois brancos
Château Tour de Mirambeau La Réserve Blanc 2012
Uvas: sauvignon blanc 58%; sémillon 38% e muscadelle 10%
A sauvignon blanc é predominante nos brancos de Bordeaux, e o resultado deste blend que passa apenas pelos tanques de aço inox, é pura fruta, clássica, com aquelas notas cítricas agradáveis e final fresco. Não melhora com o tempo. Compre e beba! Um Bordeaux na borda da piscina. U$ 38,90 (a Mistral tem por política tabelar seu preços em dólar)
Château Tour de Mirambeau Cuvée Pasion Blanc 2010
Uvas: sauvignon blanc 60%; sémillon 30%; sauvignon gris 10%
Aqui um branco mais imponente, com maior volume em boca, cítricos e algo amanteigado e um toque tostado delicado. Ao contrário de seu colega de adega aguenta uns cinco anos na garrafa. U$ 49,90
Dois tintos
Château Tour de Mirambeau La Resérve rouge 2011
Uvas: merlot 85%; cabernet sauvignon 10%; cabernet franc 5%
O tinto de entrada do catálogo, com predominância na merlot no corte bordalês e muita fruta e pouca complicação, sem grandes vôos ou pretensões, mas bem equilibrado. A revista Decanter qualificou como melhor Bordeaux para o dia-a-dia. Jean-Louis, no entanto, enxerga que para o futuro é um vinho que tende a desaparecer do portfólio pois os consumidores esperam um tinto com maior capacidade de envelhecimento. U$ 45,50
Château Tour de Mirambeau Gran Vin rouge 2008
Uvas: merlot 70%; cabernet sauvignon 30%
Um tinto com corte típico bordalês, mas como convém à região com um peso maior na merlot. Fermentaçãoo malolática nas barricas , o que ajuda no casamento, sem DR, entre a madeira e os aromas do vinho, ou seja, um não discute om o outro de quem é a palavra final: há uma boa integração. Tem uma fruta vermelha nítida (no nariz e na boca), gostosa, um tanino presente, um belo representante da região de Bordeux. Este sim, com potencial de guarda e futuro no mercado consumidor. U$ 65,90
E um doce
Château Tour de Mirambeau Sénillon Noble 2003
Uva: Sémillon 100%
De produção limitadíssima (3 barricas, e produzido a cada 2 ou 3 anos) e venda idem – “Nem sei por que o Ciro Lilla (proprietário da Mistral) importa este vinho”, comentou Despagne – este vinho de sobremesa mostra a beleza do fenômeno da botrytis, o fungo que quando ataca as frutas aumenta a doçura, a densidade dos aromas de mel, pêssego em calda e é espetacular para acompanhar um creme ou uma torta na sobremesa. Funciona até como uma sobremesa em carreira-solo. “Não é para ganhar dinheiro”, sinaliza Despagne, “mas para deixar os trabalhadores orgulhosos”. U$ 96,50.
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É dele também o surpreendente Girolate, fruto de um sistema de fermentação em barrica que vai girando, uma criação sua e do consultor Michel Rolland. Premiadíssimo e concorrendo e ganhando de grandes de Pomerol e St. Émilion (lembra deles, ali em cima?), é um outro bicho. Mas o Girolate sobe muito a régua, custa 350 dólares, e pode ser tema de outra nota, em outro contexto.
Publicado originalmente em outubro de 2014
Nos vinhos tintos, o tradicional corte bordolês foi invertido nas proporcões das uvas com a predominância da merlot sobre a icônica cabernet sauvignon, que dá o corpo e a potência dos vinhos da região. Não vi nenhuma referência de origem no rótulo, appellation d’origine contrôlée (AOC). Também não vi a marca legal de procedência, processamento e engarrafamento, mise en bouteille au château. Isso não significa que o vinho seja ruim, mas implica que ele não tem pedigree, o que para um vinho francês, não é um bom começo.
Oi Vicente, obrigado por sua participação. Na região de St. Emilion a merlot é a uva predominante do corte bordalês, há sim referência de mise en bouteille au château, mas não é fácil de enxergar no rótulo. O vinho citado é altamente recomendado em revistas especializadas com o Revue du Vin, Decanter e pelo crítico Robert Parker. Não é a única opção, claro, mas pode ser um bom começo, concorda?
abraços
Caro Gerosa,
Tenho tido a oportunidade de provar vinhos franceses para além dos Bordeaux, já que estou entre aqueles que dificilmente provarão um Margaux ou um Petrus. E tenho sido surpreendido positivamente com alguns rótulos de lugares como o Rhône e Languedoc, com um perfil bastante diferente dos Bordeaux e bem agradáveis, além de preços mais convidativos. Podem ser uma boa alternativa para explorar o mundo do vinho francês.
Grande abraço.
Caro Paulo Sales, concordo em gênero, número e grau. Rhône e Languedoc são ótimas opções, mas como exemplo de um vinho com uma tipicidade bordalesa acho que o Tour de Mirambeau pode ser um bom exemplo, este o motivo do post. Obrigado por sua participação.
abraços
Beto,
obrigado pelo esclarecimento sobre o rótulo. Ampliei a foto, mas não tinha visto o AOC nem o engarrafamento.
Vez por outro degusto um St. Emilion, que tem Gran Crus com preços acessíveis, mas a inversão entre merlot e cabernet sauvignon é ponto de contraste para mim. Médoc, especialmente Pauillac e Margaux, é a região de minha preferência. Gosto de vinhos potentes, tânicos e longevos, mas infelizmente os vinhos franceses estão sumindo do Brasil. Os vinhos do novo mundo tomaram conta do mercado e não se importa mais franceses na proporção de alguns anos atrás.
Parabéns à Mistral e a Decanter que ainda trazem alguma coisa.
Um abraço
Ótima materia…
Abraço
Edu
http://www.vinhobr.com.br/