Um editor de jornal é alguém que separa o joio do trigo – e publica o joio.
Ditado popular da imprensa
Sempre que participo de uma degustação com muitas amostras, como a que vai avaliar e premiar os dez melhores rótulos da ExpoVinis, imagino como seria descrito o roteiro da cena. (Anote: a Expovinis acontece nos dias 27, 28, 29, como foi dito no post anterior, sobre a temporada de feira de vinhos em São Paulo )
O cenário
Uma longa mesa repleta de taças vazias que vão sendo preenchidas com espumantes, brancos tintos e doces ao longo do dia. Mais de 150 amostras! Ao lado das taças, curiosos baldes. Uma grande farra, talvez. Um porre homérico, com certeza.
Os personagens
Uma dezena de respeitáveis senhores sentados em volta desta mesa. Não há nenhum representante do sexo feminino. Parecem compenetrados. O papel e a caneta na mão sugerem que vão registrar a façanha, talvez para não correr o risco de esquecer no dia seguinte…
A ação
Taças cheias de vinho. Vai começar a festa de Baco! Estes personagens passam então a exibir um estranho comportamento que consiste em inspecionar a cor da bebida, aspirar os aromas que aparecem, tímidos, e balançar a taça com movimentos firmes e repetidos. Voltam então a afundar o nariz próximo à bebida, desta vez absortos, alguns de olhos fechados, buscando na memória uma comparação que traduza a percepção aromática (a cena podia ser coberta com imagens de flores, frutas, chocolate, café fumegante, um gato fazendo xixi… não, melhor não, ia exigir explicação Aromas e Vinhos, isso lhe cheira bem?). Só então um trago da bebida é sorvido, o líquido percorre toda a extensão das papilas gustativas (esse movimento é sugerido com um bochechar discreto). Finalmente o momento de glória, aquele que é o propósito de todo produtor que plantou, colheu e vinificou as uvas: o apreciador bebe prazerosamente o vinho. Certo? Errado. Close no balde. Após todo este balé gustativo o sujeito cospe o vinho! Aí então passa a fazer algumas anotações, que culminam em alguma pontuação.
Meio nojento? Não é a cena mais plástica deste mundo, certo? Mas é assim que são julgados e avaliados os vinhos em concursos, degustações e até em feiras de vinho. E é assim que tem de ser. A explicação é simples. Não há ser humano e discernimento que agüente beber – e engolir – tal quantidade de fermentados. Por mais história, elegância e cultura que caiba dentro de uma garrafa, o vinho nunca vai deixar de ser uma bebida alcoólica. Multiplicado por cem, então, vira caso de coma alcoólica e cirrose galopante.
O paradoxo deste julgamentos é que para avaliar e distinguir os melhores vinhos é necessário prová-los em grande volume, em sequencia, sem conhecimento do rótulos e procedências. E dispensar a bebida. Baseado no conhecimento técnico, bagagem cultural, experiência e, claro, certa dose de subjetividade, os jurados devem separar o joio do trigo. Muitas vezes, diga-se de passagem, o joio é contemplado. Mas é humano, demasiadamente humano.
Os vinhos que concorrem na degustção do Top Ten da ExpoVinis são aqueles enviados pelos expositores. Concorre quem quer. Eles são divididos em uma dezena de categorias: espumante nacional, espumante importado, sauvignon blanc, chardonnay, outras uvas brancas, rosados, tintos nacionais, tintos novo mundo, tintos velho mundo, fortificados e doces. As garrafas são ensacadas, numeradas e avaliadas. As notas de cada jurado são somadas e os melhores em cada categoria levam a medalha no peito e saem anunciando por aí. Justo ou não, trata-se de um julgamento coletivo, que é mais preciso que a nota de um só critico.
Qual o critério? Bom, o degustador avalia vários aspectos técnicos da bebida: a cor, os aromas, a persistência, o equilíbrio dos componentes, sua intensidade e, no meu caso, dou importância à tipicidade do vinho. Um rótulo de tinto do velho mundo precisar trazer características desta parte do mundo vinícola, por exemplo; isso a gente chama de tipicidade, um vinho que reflete as características de seu terreno, de sua uva, de seu clima.
Outra dúvida que pode passar pela cabeça de muita gente. Após avaliar uma dezena de amostras os jurados não se cansam e o julgamento dos vinhos seguintes não pode ser prejudicado? Ou mesmo os primeiros da jornada? Aqui vale um paralelo cinematográfico. Assim como um bom ator se destaca e faz crescer um filme em qualquer parte da história que apareça, seja nos primeiros minutos, no desenrolar do enredo ou só no final, um bom vinho também é capaz de se sobressair em qualquer momento de uma degustação. A excelência é sempre fácil reconhecer.
Os jurados só conhecem os rótulos provados no momento da divulgação do resultado, que será anunciado às 14h30 do primeiro dia da feira (27/04). Na noite desse mesmo dia ocorrerá a Degustação Especial Top Ten 2010, onde serão feitos comentários sobre cada um dos vinhos contemplados.
Acompanhe a degustação do Top Ten no twitter do Blog do Vinho.
“PUPILAS” GUSTATIVAS?? Tudo bem que em certos casos comemos ou bebemos “com os olhos”. Mas não
é o caso aqui. Abraços.
Ops, Jader, falha de digitação. Devidamente corrigido
abraços
ótima matéria Beto.
abraços
jean krause
Beto,
Passei a ser leitor constante do seu Blog do Vinho. Ele é ótimo. Embora eu não seja um bom conhecedor de vinhos, bebo às sextas-feiras, no meu happy hour, com minha mulher, em casa.
Parabéns.
Zé Olimpio
Zé Olimpio
Obrigado pela sua audiência e por sua visita. Apareça sempre
Abraços
Beto Gerosa