Este não é um texto sobre vinho, mas sobre uma espécie de amizade, de companheirismo – aquele que une um homem e um cão – que de alguma forma se aproxima do tema deste blog que é da relação do homem com o vinho. Peço licença para desviar um pouco o tema, portanto.
Hoje eu levei meu cachorro para seu último passeio. Como sempre fez, agarrou a guia com a boca – mas logo largou pois agora este hábito de anos causava dor e desconforto –, abanou o rabo e aguardou ansioso o movimento de pegar o elevador, descer até a garagem e finalmente sair.
Era seu último passeio pois em seguida caminharíamos, juntos, até a veterinária que lhe aplicaria uma injeção letal para aplacar sua dor. Pupy, este era seu nome, estava com um tumor na boca que tomava todo o lado direito, que comprometia sua mordedura e consequentemente sua alimentação. Ele começava a sofrer com o inchaço, com a dor e a limitação na alimentação.
Eu sabia que era o último passeio, mas obviamente que ele não percebeu isso. Eu até podia fantasiar aqui que de alguma forma ele pressentia que estes eram nossos últimos minutos juntos, mas faltaria com a verdade. Não é assim na vida real. Subimos as escadas da clínica e ele me olhava daquele jeito que olham os cães ao seu dono, de modo cúmplice e de eterno companheirismo. Aquele olhar que nos recebe em casa com uma alegria desmedida, pouco importando se a ausência foi de algumas horas ou de alguns dias. Aquele olhar que sempre busca uma recompensa na forma de um passeio pela rua, um alimento, uma bolinha jogada ao longe ou um afago. Pupy me olhava, portanto, como olham todos os cães aos seus donos, aguardando algo de bom de minha parte, sem ter consciência de que em breve daria seu último suspiro.
Pupy era um sobrevivente – e um sedutor. Ele nos escolheu, e não o contrário como geralmente ocorre nesta relação de homens e cães. Morava numa casa que as grades eras largas o suficiente para a passagem de filhotes e a porta de vidro deixava ver sombras do outro lado. Ele estava ali, desprotegido, um pouco maltratado, encostado na porta, procurando abrigo e proteção. Demos água, um carinho e deixamos descansar ali. Permaneceu lá no dia seguinte, fomos deixando e assim nos adotou.
Como tinha sua origem na rua andava sem coleira, ficava solto. Como os cães de rua sabia atravessar e desviar dos carros. Achávamos graça. Até o dia em um automóvel pegou em cheio no meio da rua perto de casa. Com o impacto ele tombou e derramou seu sangue no asfalto. Socorrido pelo motorista que o atropelou e pela minha mulher foi desfalecido para o veterinário. Sobreviveu ao primeiro baque e depois de uns dias voltou para casa. Ganhou sua primeira guia a partir de então.
Sedutor, quando mais jovem pulava alto como um cabrito quando recebia algumas pessoas de quem gostava, deixava-se acariciar pelas crianças que estudavam em uma escola maternal perto de casa, mas para não negar o folclore tinha alguma cisma com carteiros. Quando eu estava deitado no sofá subia com as duas patas dianteiras no meu corpo, encostava a cabeça no meu colo e às vezes dormia neste posição improvável até que as pernas se desiquilibravam. Companheiro, me seguia onde quer que eu fosse. Por dezesseis anos
Em outro endereço foi atropelado pela segunda vez em frente de casa, quando escapou da garagem e saiu correndo e ninguém conseguiu alcançar. Ficou sumido uns dois, três dias. Procuramos por todo canto e nada. Descobrimos instalado numa casa numa rua próxima. Sobrevivente e sedutor já tinha bacia de água e guarida em seu lar provisório.
Teve outros cães como companheiro mas já idoso deu uma remoçada quando compramos um Boston Terrier para meu filho mais novo. Os cães domésticos como não têm de lutar pela sobrevivência ficam meio infantilizados até quase o fim da vida e Pupy passou a brincar com o filhote como se tivesse a metade da idade. No último ano de vida a idade começou a pesar, passou por cirurgias complicadas mas sempre com uma surpreendente recuperação. Parecia que viveria para sempre. Mas a nova doença chegou.
O tempo que os cães passam com a gente cria laços e sentimentos que às vezes humanizam um pouco a relação. Sofremos por seus problemas, doenças e principalmente por sua finitude. Aos cães é permitido a decisão da eutanásia, uma solução que por mais dolorida que seja é sempre pensando no bem estar do animal. Egoismo é manter o bichinho vivo, sob medicamento pesado, cirurgias doloridas e qualidade de vida comprometida. A decisão é dura, mas tomamos junto com a veterinária e hoje era o dia. Dei o último passeio e fomos para a clínica
Decidimos ficar ao seu lado até o seu final. Ele estava impaciente, não gostava daquele ambiente que lembrava injeções, caminhava alegre pela sala, abanando o rabo, enquanto aguardávamos a veterinária. Pupy me olhava então com aquele olhos de absoluta confiança, esperando sempre algo de bom de minha parte. E por mais sofrido que fosse esta solução eu tinha certeza que este era o melhor que eu podia fazer por ele: propiciar uma boa morte, um fim sem dor.
A veterinária primeiro aplicou um sedativo. Pupy sentiu os efeitos logo e foi se espalhando pelo chão. Seus olhos ficaram abertos, mas o corpo não obedecia mais seus comandos. Ainda respirava profundo. Foi colocado deitado na mesa de consulta. Um soro foi injetado e em seguida a veterinária anunciou que iria aplicar a injeção. Nos aproximamos, minha mulher e eu, demos um último afago, seus olhos já estavam perdendo o brilho. A agulha atingiu seu corpo. E o Pupy se foi. Foi nosso último gesto de gratidão ao meu companheiro de dezesseis anos.
olha amigo,nem me fale,sinto muito pelo seu amigo,,,tenho um pitt bull que crio desde pequenininho,quando eu o comprei ele sentado cabia na palma da minha mão!!hoje já se passaram de dez pra onze anos,isso na idade dos cães é uma eternidade,e os sinais de doenças da velhice já começam a aparecer,ele é meu unico amigo as vezes fico bravo com suas travessuras,mas passa,hoje mesmo estava conversando com ele,sobre a morte,pois tenho gasto tdo mes na farmacia com remedios para ele e sei que alguns dos sintomas que ele tem são irreversíveis!!Sei que vou sentir muito a sua falta,sua bagunça,até do trabalho que tenho para limpar o quintal!!sei que isso será pouco diante da dor que irei sentir e que voce deve estar sentindo agora!!Estes dias me peguei pensando;espero que Deus tenha reservado um céu para os amigos caninos;e se eu quando partir dessa tiver a graça de ser chamado pelo Senhor Deus para ir ao céu,a primeira coisa que pedirei a ele que traga meu amigo,meu cachorrinho comigo,desde já peço aproveitando seu espaço para pedir perdão pelas vezes que fui maldoso com ele,deixei de leva-lo para passear etc… e digo por último descanse em paz Puppyque o senhor tenha um cantinho no ceu pra você!
lágrimas caem dos meus olhos agora
Beto, acompanho teu blog pois aprecio demais bons vinhos e tuas dicas são preciosas, mas hoje, me sinto tão honrada e emocionada ao ler tua história de amor, solidariedade e misericórdia para com teu companheiro de 16 anos!!! Pupy descansou e partiu levando consigo a melhor imagem que animais podem ter de nós humanos; ele foi amado profundamente. Estou escrevendo emocionadíssima enquanto minha beagle – Lunna – de 10 anos (com uma série de probleminhas de saúde, mas muito querida e preciosa) descansa enroscada em meio às almofadas em minha cama. Eu, pessoalmente, acredito que em outra dimensão, nos encontramos com esses nossos parceiros de quatro patas…agora seria apenas uma pausa na convivência e Pupy permanecerá no melhor lugar onde se pode estar, no coração de vocês. Tenham um bom domingo.
… sei o que voce esta passando,tive que fazer o mesmo com meu gato e, ate’ hoje sinto sua falta. Forca, Deus te conforte.
Eu tive um cão que sofreu com a aids canina, levei ao veterinário e ele sugeriu a eutanásia, eu não aceitei e o levei para casa, um dia e meio depois morreu , naturalmente, agradeço por não ter feito a eutanásia e o deixado viver cada minuto de sua vida. A morte que o veterinário disse que seria terrível, não foi tão terrível assim, foi uma morte natural e condizente a sua doença. As vezes tentamos abreviar o nosso sofrimento e não o sofrimento do cão. Somos egoístas. A VIDA POR MAIS DOLOROSA QUE SEJA SEMPRE VALE A PENA E DEVE SER PRESERVADA. No caso do seu cão o seu maior inimigo não foi a doença mas seu dono que se tornou seu algoz, dono a quem mantinha a maior confiança. O relato foi emocionante mas o desfecho foi lamentável. Ainda bem que a eutanásia não é permitido entre os seres humanos, senão não teríamos mais entre nós velhos, doentes e deficientes que tanto incomodam a alguns por seu sofrimento.LAMENTÁVEL REPITO LAMENTÁVEL.
Pois é, senhora Miriam. O bom é preservar a vida a qualquer custo, mesmo quando a dor e a doença fazem com que ela não valha mais a pena. Vamos manter bichos e pessoas até que não consigam mais respirar sozinhos e morram sufocados, em meio a um sofrimento dos mais atrozes, mas naturalmente! É brincadeira, não? Lamentável, minha cara, é o julgamento que a senhora estabelece nesse momento sobre o autor do texto, como se sua decisão tivesse sido fácil e impensada. Desrespeitou não só a dor e a saudade que ele certamente sente, mas também a dignidade de um animal que não mais conseguia comer e se movimentar normalmente e a nossa inteligência…
Me fez chorar pela dor dos donos, mas que sorte teve o Puppy de ter encontrado donos tão carinhosos.Infelizmente muitos cães não tem um destino feliz, muitos são vitimas de abandono, crueldade, fome e medo.
é muito dificil expressar a dor, principalmente quando temos que abreviar a vida
do fiel e eterno amigo, MAX, um boxer me acompanhou por 10 anos e 2 meses,
foram anos que passaram muito rápidos, mas de muitas alegrias, lendo os
comentários, me solidarizo com todos, só quem ama estes anjos sabe a falta
que fazem nos nossos corações
Sinto muito pelo seu amiguinho…não tem como não ficar triste junto com vc,pra vc mesmo também não deve ter sido fácil…sempre tive cachorro em casa e sei como é o sentimento da perda desse tipo de amiguinho,eles acabam virando um parentezinho de quatro patas,a gente sente aquela falta dele andando pela casa…Eu sei que não seria a mesma coisa adotando outro mas eu sugiro pois parece que alivia um pouco aquela falta.Ao menos ele não se foi sem saber oque é ter uma casinha dele e um afago amigo….Deus te abençõe ea sua familia também…. 🙂
Sei exatamente como é sentir essa perda, sinto-me solidária a sua dor. E a vida continua.
Abraços
Inevitável não chorar ao ler esse texto, pois sou apaixonada por cães. Tb passei pela mesma situação, a de sacrificar um dos meus cachorros (Kuma, que em japonês significa urso, qdo filhote era igualzinho). Aos primeiros anos de vida, descobrimos que ele tinha epilepsia, e tomava Gardenal todos os dias. As convulsões tornaram-se mais fortes e frequentes, e o médico acrescentou Tegretol. Tomava 2x/dia. Porém ele não podia estressar demais. Após o falecimento do meu pai (6 anos atrás), percebemos que a saúde do Kuma tb foi piorando. Não tinha mais as convulsões, mas por problemas na coluna que limitava os seus movimentos (não evacuava, não urinava, precisava de ajuda p/ se locomover), seriam necessária visitas semanais (ou quase que diárias) p/ injeções de medicamentos, e lavagem estomacal… e seria assim p/ o resto da vida… Eu fui contra, mas seria muito egoísmo da minha parte mantê-lo vivo dessa forma… Nunca me esqueço do dia, bonito, ensolarado e hj acredito que ele esteja ao lado do meu pai… Nunca deixei de ter cachorros, o amor por eles é muito grande (hj estou com 3, mas sempre lembrando dos anteriores!). Parabéns pelo blog e mta luz e força p/ você e sua esposa.
CHOREI MUITO AO LER ESSA LINDA HOMENAGEM QUE VOCÊ FEZ AO SEU CACHORRINHO. ELES NOS ACOMPAANHAM NOS BONS E MAUS MOMENTOS, TENHO CERTEZA QUE ELE FOI FELIZ COM VOCÊ E SUA FAMÍLIA.