Vinho português não chega a ser uma novidade na mesa dos brasileiros. Quem aí do outro lado da tela nunca provou um cálice de Porto, uma taça do vinho verde Casal Garcia ou mesmo o tinto Periquita, nome que é motivo de um sem-número de piadas entre os neófitos, mas que não provoca qualquer comentário malicioso entre seus habituais consumidores.
Mas… Lisboa, temos problemas. Os representantes dos tintos d’além mar no Brasil não ficaram nada satisfeitos com a posição que coube a Portugal no ranking em volume de garrafas importadas em 2008: 4º lugar. A Itália atropelou nossos colonizadores e passou para a terceira posição (ver tabela abaixo).
1º Chile 34,38%
2º Argentina 26,54%
3º Itália 17,91%
4º Portugal 11,24%
5º França 4,54%
ATUALIZAÇÃO (16/07/2009)
Portugal volta a ocupar o terceiro lugar!
Acabo de receber, do consultor Adão Morellatto, um informe com o mais recente levantamento do mercado de vinhos importados no 1º semestre de 2009, comparando com igual período de 2008. Aparentemente os tintos e brancos lusitanos voltam a ocupar o terceiro lugar mais em virtude da queda dos italianos – fenômeno que Adão ainda tenta destrinchar – do que pelo crescimento dos portugueses. Em todo caso, mostra uma reação e uma valoração nos preços. Reproduzo na íntegra, sem edição, abaixo:
Conforme havíamos previsto houve uma queda de 1,923% em valor e de 0,871% em volume, refletindo muito o mercado de capitais, a partir de setembro/08. Assim manifestaram-se os principais players do mercado:
1. CHILE – Novamente deverá fechar o ano como principal exportador, com 33,55% de Share Value e 38,42% de Share Market, apresentando um crescimento de 1,457% em valor e de 2,130% em volume, como este ano há uma desgravação aduaneira, que estabelece o produto chileno próximo de 9% de I.I. (Imposto de Importação), provavelmente seguirá com esta tendência de crescimento.
2. ARGENTINA – Também segue a tendência de consolidação como 2º maior exportador, mas apresentando um Share Value de 23,63% e Share Market de 27,03%, com crescimento próximo ao apresentado durante todo o ano de 2008 de 4,789%.
3. PORTUGAL – Destacamos a performance equilibrada deste exportador, não sofrendo muita alteração em sua participação há alguns anos, apresentando um Share Value de 14,25% e Share Market de 11,11%, observado que seus vinhos possuem um custo médio de US$ 3,07 e com posicionamento constante de valoração.
4. ITÁLIA – Foi o país que apresentou a maior queda entre os cinco primeiros players, com queda de 17,493 de Share Value, e com uma representatividade de 12,05%. Ainda estou levantando alguns dados na origem para identificar a razão para tamanha queda.
5. FRANÇA – Também apresenta uma queda acentuada de 9,848% de Share Value e com participação de 9,08%.
6. DEMAIS PAÍSES – Observa-se uma queda de 4,939% em Share Value.
Conforme dados acima, o primeiro semestre sempre apresenta uma queda, pois é um período típico de reposição, no segundo semestre, mantendo as paridades cambiais vigentes, teremos um quadro mais animador e de acordo com algumas fontes, grandes redes de mercado, iniciaram conversações para o fim do ano, portanto, provavelmente apresentaremos em Janeiro de 2010, uma situação mais otimista, observando que o mercado atual, já desovou grande parte do stock remanescente e já se observa uma demanda de aquisição e reposição de produtos.
O contra-ataque
Portugal não entrou em guerra, mas também não acovardou-se. E prepara o contra-ataque. Se 2009 é o ano da França no Brasil, o braço lusitano que promove os vinhos da terrinha no mercado interno e externo resolveu promover por aqui o Ano do Vinho Português. Em uma parceria com a Associação Brasileira de Sommeliers, a Viniportugal irá promover palestras com enólogos representativos das regiões mais importantes de Portugal. Já participaram das degustações: a estrela da Bairrada e do Dão, Luis Pato, com seus vinhos homônimos, e, mais recentemente, veio comentar seus brancos e tintos o enólogo Nuno Cancela de Abreu, da vinícola Quinta da Alorna, do Ribatejo.
Ribatejo? Não! Agora pode chamar de Tejo
O Ribatejo, como várias outras regiões do planeta, melhorou muito a qualidade de seus vinhedos e rótulos nos últimos vinte anos. Para mudar a imagem de seus produtos, o pessoal da Comissão Vitivinícola Regional (CVR) do Ribatejo teve então uma grande ideia. Se o Ribatejo estava associado a vinhos de grande volume e pouca qualidade do passado (lá chamados de “vinho carrascão”), resolve-se o problema eliminando as inicias do nome, rebatizando-a como Tejo. O Rio Tejo, com seus 1009 quilômetros de extensão, é símbolo da região, que corta em duas metades. De certa forma esta decisão repete o batismo de outras regiões vinícolas da Europa, estabelecidas em torno de rios, a exemplo do Douro. Mesmo assim, creio que a decisão partiu de um palpite de algum marqueteiro ou uma consulta a um numerólogo. Parece piada. Ribatejo e Tejo não faz lá muita diferença.
O enólogo Nuno Cancela comentou a um grupo de jornalistas que o novo nome também facilitaria o reconhecimento dos rótulos no principal mercado mundial de vinhos, os Estados Unidos. Ah, tá… Fica combinado então que para o americano médio ficou mais simples dizer Tejo. Mas e quando o mesmo sujeito topar com as uvas nativas? Como vai pronunciar fernão pires, alicante bouschet, castelão, tinta miúda, touriga nacional…
Opinião divergente
Reproduzo aqui um comentário assinado por Azeredo no fórum Enogastronomia – um dos fóruns de vinho mais movimentados da web.
Azeredo rebate minha observação irônica sobre a mudança de Ribatejo para Tejo com o seguinte argumento:
Não, não foi obra de marqueteiro, nem de numerólogo, muito menos é uma piada, e faz uma enorme diferença.
A decisão é discutida há muitos anos, foi embasada nos relatórios e pesquisas sobre o vinho portugues nos mercados internacionais.
Todos eles mostram que uma das sete grandes barreiras para a divulgação e aceitação dos vinhos portugueses no estrangeiro é’ o desconhecimento e dificuldade dos consumidores de localizarem a sua origem.
Isto faz uma enorme diferença, para quem quer conquistar mercados altamente competitivos.
Assim sendo, a “última do português” é uma medida extremamente salutar, que aumentou em 27% as exportacoes para paises consumidores.
Comento
Azeredo, como se vê, tem uma argumentação sólida, por isso acho que vale a intervenção neste espaço, apesar de ele ter enviado sua opinião em outro fórum de discussão. A ironia do texto foi levada ao pé da letra. O que acredito, e tento expor nesta nota, é que é o salto na qualidade dos vinhos da região – mencionado no texto – que impulsiona o crescimento nas vendas. A troca de nome é uma consequência, uma decisão de marketing. Aliás, a mudança é recente, não deve ter influenciado, ainda, o aumento em 27% as exportações dos vinhos portugueses.
Vinhos: um espumante, um branco e dois tintos
Das minhas recentes incursões pelo terreno lusitano, quatro indicações, para momentos diferentes, já que o tema aqui é Portugal
Bairrada
Espumante Baga Luis Pato rosado bruto (R$ 67,00, na Mistral) – Indicação de espumante português não é piada. É uma boa opção também, pode acreditar. Este frisante rosado é elaborado com a uva baga, que fez a fama de Luís Pato. Seco e refrescante, tem aquele aroma de frutas vermelhas frescas e uma acidez que limpa a boca, que é o que se espera de um bom espumante, com um toque diferenciado no sabor que o rosé traz. Arrisque, e depois venha comentar aqui.
Riba(ops) Tejo
Quinta da Alorna Branco 2008 (R$ 36,90) – Na minha eterna evangelização dos brancos nesta coluna, aqui vai uma sugestão que é saborosa e de preço atraente. Muito fresco. A uva arinto dá notas de frutas mais amarelas, como melão, e a fernão pires aquela sensação cítrica e viva. Um belíssimo vinho de entrada, de piscina.
Quinta da Alorna Reserva Tinto 2007 (R$ 73,50, ambos encontrados na Adega Alentejana) – A uva cabernet sauvignon, misturada a uma das maiores representantes do solo português, a perfumada touriga nacional, cria este vinho de corte que descansa em barricas novas de carvalho francês por um ano antes de ser engarrafado. Se o primeiro branco é um vinho de piscina do Tejo, já este é tinto para a sala de jantar, com frutos mais maduros, taninos mais complexos e maior estrutura, reafirmado pelo final consistente.
Douro
Quinta da Touriga Chã 2004 (de R$ 137,00 por R$ 79,00, até dia 31 de julho na liquidação da Interfood Clasics) – Esta é uma daquelas boas ofertas que valem a pena para conhecer um produto diferenciado. A touriga nacional é “a uva” portuguesa por excelência – bem conduzida e vinificada se transforma em caldos muito interessantes. Este aqui (80% touriga nacional e 20% tinta roriz) é, ao mesmo tempo, delicado no nariz (flores, violetas) e potente na boca (frutas negras e doces). Desce macio e pede mais um gole. Acompanha bem assados, mas acompanha melhor ainda um bate-papo entre amigos que gostam de um bom vinho português.
Belo post, Gerosa.
Um brinde aos vinhos de Portugal e por falar nisso, no próximo encontro da Confraria vamos falar (e degustar, óbvio) dos Verdes.
Caro Gerosa, considerando-se que os números que deixam a Itália em terceiro incluem vinho Lambrusco, penso que em vinhos tranquilos Portugal segue na frente, ou não? Bem, de qualquer forma, na minha mesa, os vinhos Lusos seguem na frente! Salute
Viva!!! Olha aí o nosso trabalho aparecendo.. Aproveito para lembrar que em 2 de setembro teremos o Ricardo Pinto Correia da Casa Santos Lima por aqui para falar sobre a região Lisboa, ex Estremadura dando continuidade ao Ano do Vinho Português.
Beijos e Saúde,
Fernanda
Prezado Roberto,
Gosto muito do seu blog, mas venho notando rareamento nos posts!
Abraços.
Caro Gerosa
Sou um bebedor diário de vinho.É a única bebida que aprecio e posso consumir. Não contesto os dados que v traz sobre as nossas impotações de vinho. Só que todo vinho chileno que já tomei, alguns em teste cego, têm, para mim, um maldito sabor de água bebida na mangueira de borracha. Explico, na infância interrompíamos a pelada disputada na rua para hidratar os atlétas na mangueira de borracha do jardim da casa mais próxima, os primeiros goles eram sorvidos sem qualquer apreciação, a sede falava mais alto, mas os últimos tinham o gosto da mangueira que tranportava a água. Sempre batia um sério arrependimento por ter sucumbido à sede. É um retro-gosto que se sente no nó do nariz, horroroso! O problema é só meu, só eu sinto? Ou isso está relacionado com a anosmia geral de que padesse a humanidade. Agradeço se V. puder me esclarecer
O blog foi todo revitalizado, tudo bem. Mas qdo voltará a ser realmente um blog? Pra atualizar é um parto! Que preguiça!!!!
Realmente, como disse no comentário anterior, as atualizações estão vindo numa frequência cada vez menor. O último post é do dia 08 de julho (ainda que tenha sido posteriormente atualizado) e já estamos no final do mês! Acho que, pelo menos, as atualizações deveriam ser semanais, porque assunto sobre vinho é o que não falta.
Sr. Roberto Gerosa,
o Vinho é assunto sério.
São dispensavéis alguns comentários c/ efeitos redutores, em relação a quem c/ o seu esforço, sabedoria e tradição faz o seu melhor p/ que este nectar possa chegar aos copos daqueles que verdadeiramente o apreciam.
É preciso entender o valor económico e cultural que a vinha tem para uma região como o ribatejo, p/ apoiar aqueles que investem em novas ideias e formas de consolidar o grande potêncial desta Região.
Pois é meu caro Gerosa apesar da sua avançada idade ainda vai ter tempo de ouvir falar, muito e bem dos vinhos da proveniência Tejo.
Boas provas. neste mundo pequeno, quando a alma é grande.
Ilha Terceira-Açores