Imagine a cena. Você pede um vinho rosé no restaurante (ok, é uma situação um pouco rara, mas como se trata de ficção, vale a imagem). O garçom traz uma garrafa de vinho tinto em uma mão e outra de vinho branco na outra. Ambas abertas. Gentilmente trata de misturar as duas cores na sua taça, até entender que o resultado foi um rosé “da casa”.
Exageros à parte, é o que pode acontecer no mercado do vinho rosé, se produtores da união europeia aprovarem no próximo dia 27 de abril este método de elaboração do rosado. Aqui cabe um parêntese, o bom rosado, claro, não é (ou não era) resultado da mistura dos dois vinhos, tinto e branco. Trata-se de outro bicho.
A maioria dos vinhos rosés é feita de uvas tintas e sua cor vai desde o rosa pálido até o vermelho-escuro. Essa variação se deve ao tempo em que a casca da uva é mantida em contato com o líquido e aos processos de fabricação da bebida. Há três métodos de elaboração:
Maceração
Como é: depois de ser prensada, a uva é mantida em contato com o líquido por um tempo que varia de seis a 24 horas. Depois dessa etapa, chamada de maceração, as demais fases da produção são semelhantes às do vinho branco, fermentado em temperaturas mais baixas
Características: de cores mais claras e sabor suave
Sangria
Como é: depois de espremidas, as uvas são colocadas num tanque para fermentação. Quando o líquido começa a fermentar, transformando o açúcar em álcool, uma parte é retirada para a elaboração do rosé. O restante se torna vinho tinto
Características: de cores e gostos mais fortes
Mistura
Como é: é a que se pretende aprovar. Consiste em misturar uma quantidade de vinho branco com vinho tinto.
Características: oxidação rápida. O vinho estraga em um ano
O que está se tentando tornar legal é uma prática mais rápida e mais barata de produzir rosés em massa, de qualidade inferior, mirando o sedento mercado chinês.
Se o rosé já sofre algum preconceito por parte dos consumidores, e de muitos especialistas, a “batida” de vinho tinto e branco é capaz de prejudicar de vez a imagem desta bebida saborosa, descomplicada, mas nem por isso carente de qualidade, tipicidade e tradição. A região da Provence, na França, que o diga.
Como declarou Xavier de Volontat, presidente associação de viticultores da região Languedoc, no sudeste da França ao jornal telegrah.co.uk, misturar vinho branco com algumas gotas de tinto – esta na verdade seria a grande mudança, a predominância de uvas brancas como chardonnay e sauvignon, tingidas por gotas de cabernet, shiraz, merlot – “cria um vinho, no máximo, laranja, jamais um rosé”. Para Gilles Masson, diretor do centro francês de pesquisas de vinho rosé, “A delicada harmonia entre a coloração, aroma e sabor do verdadeiro rosé se perderia.”
E os produtores nem ficam rosé de vergonha… ui, essa foi mal.
Lamentável o descaso com que é tratado o vinho rosé.
Como sempre, a mira do lucro fácil vai levar a fazer-se mais uma asneira. Pelo contrário, deveria lutar-se pela boa tradição de forma a salvaguardar a nobreza de um produto com direitos próprios como é o Vinho Rosé de maceração.