Harmonizar vinho e comida é simples no atacado e complicado no varejo. A regrinha básica desta difícil – e prazerosa – arte impõe: carnes vermelhas com tintos e peixes com brancos.
Fácil? Engano. Aí entram outros ingredientes, texturas e uma infinidade de variedades e sabores que complicam a combinação perfeita, isto é, aquela que maximiza o sabor do alimento e propõe uma parceria com o vinho. Para tentar ajudar aqueles que estão atrás da harmonização ideal são produzidas inúmeras e extensas listas que só confundem e atrapalham. Este Blog do Vinho prefere passar uma receita mais simples, mesmo que redutora das possibilidades.
Harmonização por cor
Uma associação cromática por similaridade pode facilitar o entendimento da regra básica da combinação comida e vinho.
- Vinhos brancos combinam com alimentos menos coloridos, como as carnes brancas de peixes, aves e frutos do mar, e pratos com molhos igualmente brancos
- Vinhos tintos combinam com alimentos mais escuros, como carnes vermelhas, molhos de tomate, de tonalidades mais escuras e, claro, molhos feitos com o próprio vinho tinto.
Harmonização por peso
Outra boa linha de harmonização aconselha a harmonização pelo peso dos alimentos. Aqui vale a reprodução do trecho do livro Comida e Vinho, dos especialistas José Ivan Santos e José Maria Santana (a gente sempre deve recorrer aos mestres que já se debruçaram sobre o tema, em vez de reeditar o que já foi escrito, certo?)
“Alimentos e vinhos têm peso, e ele deve ser levado em conta na harmonização. Um vinho potente vai atropelar uma comida leve e o contrário também é verdadeiro. As proporções de um e outro devem ser parecidas. Sabores delicados pedem vinhos delicados. A gente sabe quase naturalmente o que é uma comida leve ou pesada.
- Peixe grelhado ou um espaguete fininho com molho de manteiga de sálvia são pratos sutis, um convite para um branco leve.
- Uma refeição à base de pão e queijos de massa mole está mais para peso médio, acolhendo bem um branco de corpo médio, como um chardonnay sem muita madeira ou tinto jovem, um pinot noir ou malbec.
- Cordeiro, caça, carnes e massas com molhos copiosos e com queijos de pasta dura são comidas de sabor forte. De maior peso, que pedem um vinho à altura, com um musculoso cabernet sauvignon, um barolo, um tannat ou um shiraz australiano potente.”
Quebrando regras
Mas as regras só existem para serem quebradas, não é mesmo? Você tem de agir conforme as circunstâncias. Em uma festa não cabe buscar a combinação perfeita, em um restaurante, quando um casal se divide entre um peixe e um cordeiro ou alguém sai perdendo ou ambos cedem – e se escolhe um tinto ou branco de corpo médio. Mas perder também pode significar arriscar. E tirar proveito da situação.
E branco com carne vermelha, pode?
Cheguei em casa e tinha um delicioso alvarinho aberto, Reguengo de Melgaço 2007 – um branco saboroso da uva de mesmo nome, da região do vinho verde, no Minho, noroeste de Portugal. Há vinhos verdes mais rústicos e populares, daqueles com elevada acidez e um toque frisante, há outros com mais equilíbrio, fruta presente, uma boca mais ampla e bastante aromático e gastronômico, como este rótulo que tinha desarrolhado ou os soberbos vinhos de Anselmo Mendes, um craque do alvarinho (na Espanha conhecido como albarinho).
Na mesa uma delicioso prato preparado pela minha mulher: pinóia, uma receita passada por uma amiga querida. Trata-se de um rocambole de carne temperado e recheado de presunto, queijo e uma pitada secreta. Sem molhos para acompanhar. Acompanhou arroz e maionese. Ou seja, comida daquelas que se tem em casa, e não no restaurante.
O que eu fiz? Aproveitei o alvarinho aberto, despejei na taça e fui sorvendo aos goles antes da refeição. Boca amaciada continuei com os goles do branco português entre uma bocada e outra do rocambole e seus acompanhamentos. Harmonizou? Desceu que foi uma beleza, não brigou com a comida, o rocambole era leve, a maionese refrescava o palato e o vinho verde limpava a boca e agüentava o tranco com uma boa estrutura. Um tinto era a melhor saída? Sem sombra de duvidas, mas o objetivo aqui era experimentar – e aproveitar o vinho aberto.
Lição da noite: nada é tão rígido que não deva ser desafiado no mundo do vinho. Quem faz as regras é o seu paladar. Quando o resultado é positivo, é puro prazer. O preço do erro é quebrar a cara, e passar a considerar o copo de água a combinação mais interessante. Audácias eventuais na harmonização merecem o aplauso, mas convém não exagerar e cair no mau gosto que pode render algumas vaias. Dos especialistas e do seu amigo enófilo? Não, essas não importam. Vaias do seu paladar mesmo, seu melhor crítico.
Participe: você já tentou alguma harmonização fora do padrão? Compartilhe com os leitores na área de comentários sua experiência.
Sr. Beto Gerosa,
Sempre tive dificuldades para identificar qual vinho combina com que tipo de comida. Sempre que tenho oportunidade procuro me informar sobre esse assunto, porém, as opiniões são controvertidas. Hoje, 03.03.11, tem uma matéria no Caderno Paladar do Estadão, assinada por Eeric Asimov, com o t´tulo de “É hra de descomplicar o vinho: dá para dizer tud em duas palavras”. Como fazer para melhor se informar ? existe alguma cartilha sobre o assunto ? Gostaria de saber.
Ronaldo Martins
Vinho bom é o líquido dos Deuses , e mais se for um Casal Garcia Português Branco , que maravilha , e também o Amarante muito bom . Vinho é o liquido que Deus criou ,e ele deveria estar muito concentrado para produzir uma coisa tão deliciosa . Mas como disse o nosso Ex-Presidente bebo porque líquido o é ,porque se sólido o fosse ,eu o comeria .
Muito Obrigado,
Luis
Esses dias tomei um Chateau Petrus acompanhando um creme de abacate com maizena…Até que ficou bom.
Deve ter melhorado muito o abacate, caro Eduardo
Vou transcrever o texto e no final vou dar minha opinião. “O que eu fiz? Aproveitei o vinho aberto, despejei na taça e fui sorvendo aos goles antes da refeição. Boca amaciada continuei com os goles do branco português entre uma bocada e outra do rocambole e seus acompanhamentos. Harmonizou? Desceu que foi uma beleza, não brigou com a comida, o rocambole era leve, a maionese refrescava o palato e o vinho verde limpava a boca e agüentava o tranco com uma boa estrutura. Um tinto era a melhor saída?
Na minha opinião, Viadagem pura!
Caro Eduardo
Fico feliz que tenha lido até o final do post.
Sinal que tem algum interesse no assunto, mesmo que seja para discordar.
São para leitores como você que este Blog é feito.
E cada um opina de acordo com sua capacidade de expressão.
Apareça sempre
abraços
Não é tão complicado quanto parece, pessoas sem muito conhecimento de vinhos tomam decisões similares quando escolhem o refrigerante para acompanhar um peixe ou um churrasco. O problema é lembrar que sabor um vinho tem. E nessa hora, conhecer as características é como um músico saber ou não ler uma partitura.
Hahahahahaha…
pelo visto o EDUARDO PEREIRA é muiiito chegado numa viadagem!!! Até transcreveu
o final do texto…
Saia do armário, querido! Aproveite que é carnaval…
nem todas as regras podem ser quebradas , os resultados podem ser catastróficos !!!!!!!!!!!!!
Amigos,
Estou iniciando no mundo dos vinhos, sem dúvida uma viagem de sabor e prazer, mas como todo principiante tenho minhas dificuldades e estou sempre atento ao que se escreve nos artigos, busco sempre vinhos simples, de sabor agradável, e que “desçam redondo”, se é que posso usar essa expressão com os vinhos. Gostei da coluna e aguardo boas dicas, parabéns pela forma “tranquila” e pelo bom senso de humor.
Flávio Soares
Excelente matéria!
Saúde e paz!
Will
Como combinar vinho e comida!