A festa da transmissão do Oscar é como o show do Roberto Carlos na TV Globo. Tem todos os anos e os críticos sempre reclamam. Mas todo mundo assiste – e comenta. Mais ou menos como o malbec argentino… Os especialistas torcem o nariz, mas todo mundo compra – e bebe.
No domingo, dia 27 de fevereiro, calcula-se que cerca de 1 bilhão de espectadores deve grudar na frente da telinha para checar qual filme será o vencedor das telonas – e ainda saber quem vai levar para casa a estatueta de melhor ator, atriz, diretor. Por que não acompanhar a festa com uma taça de vinho na mão? O Blog do Vinho se propõe associar, da maneira livre, os dez títulos que concorrem ao Oscar 2011 a um estilo de branco, tinto, espumante ou fortificado. Uma espécie de harmonização de filme & vinho. Aí o aficionado pela sétima arte e pelos fermentados pode unir dois prazeres de maneira divertida.
Os filmes e os vinhos
“Cisne Negro” – Os conflitos de uma bailarina, interpretada com maestria por Natalie Portman, transformam o mundo da dança numa história de horror psicológico que mantém o espectador tenso do começo ao fim. No roteiro, o conflito da personagem principal é representado pelos movimentos singelos do cisne branco e pela sensualidade do cisne negro, pano de fundo do balé de Tchaikovsky retratado na obra.
Vinho para acompanhar – Em um filme onde a dualidade e a busca da perfeição são componentes que definem a trama, a escolha do vinho se dá por meio de uma uva caprichosa, a pinot noir, capaz de produzir dois vinhos de diferentes estilos: os elegantes borgonhas e os estonteantes champanhes O caldos da Borgonha têm alma feminina. A pinot noir é uma uva delicada, que gera vinhos que nunca são óbvios; a cor e os aromas sugerem delicadeza e elegância, na boca pulsa uma força impactante; seus sabores e aromas se revelam em camadas que passam do sublime ao surpreendente. A pinot noir também é a uva usada nos melhores champanhes, geralmente parceiros da branca chardonnay. Um tipo de champanhe porém tem a alma Cisne Negro, produzido somente da uva tinta pinot noir resulta no espumante Blanc de Noir. Pinot noir, uma uva Cisne Negro por excelência.
“Bravura Indômita” – Refilmagem do western de John Wayne, de 1969, sobre uma adolescente que contrata um oficial do Exército norte-americano bêbado para encontrar o assassino de seu pai.
Vinho para acompanhar – Um western talvez combine mais com um Bourbon do que com um vinho, mas mesmo neste campo também é possível uma “harmonização”. Na Austrália é produzido um rótulo concentrado e parrudo, da uva shiraz, o Dead Arm, ideal para acompanhar pratos fortes. O nome representa uma doença que atinge algumas vinhas da vinícola. Um dos braços da videira morre lentamente, beneficiando o outro braço restante, que acaba produzindo frutos concentrados e saborosos. Uma videira que supera as agruras da natureza e dá a volta tem uma pegada western, não?
“A Rede Social” – O filme conta a história de Mark Zuckerberg e a criação do Facebook. Os bastidores da montagem do site de relacionamento que todos nós usamos – e os conflitos pessoais dos nerds de Harvard que criaram a ferramenta e se tornaram milionários – retratam pela primeira vez a geração internet no cinema.
Vinho para acompanhar – O filme registra alguns porres e algumas taças de vinho em seu roteiro. Um chardonnay amadeirado e bem cremoso, no estilo californiano, com aquela baunilha exalando pelas bordas da taça, é a companhia ideal para bebericar enquanto se acompanha os monólogos cínicos do personagem de Mark Zuckerberg – e ao mesmo tempo digitam-se comentários no Facebook pelo celular. Este estilo de chardonnay Novo Mundo hoje é comum em todos o planeta, são assim alguns brancos desta uva produzidos no Brasil, no Chile, na Argentina, na Austrália, Itália, nos Estados Unidos e até mesmo onde menos se espera, como em Israel.
“Toy Story 3” – A animação computadorizada que revelou o cowboy Woody e o astronauta Buzz Lightyear tem seu no seu terceiro episódio sua história mais emocionante. O ritual de passagem da infância para a adolescência é visto aqui do ponto de vista dos brinquedos, que esquecidos em um baú são acidentalmente levados a uma creche repleta de outros brinquedos comandados por um urso do mal. Entre aventuras, fugas e cenas hilárias – como a dos personagens da Barbie e do namorado Ken – a animação conquista o público infantil e encanta o adulto.
Vinho para acompanhar – Afastem as crianças das taças, mas um Beaujolais Nouveau é o rótulo ideal para quem está torcendo pela animação na festa do Oscar. Elaborado com a uva gamay, é um vinho muito leve, frutado e feito para beber jovem. Um tinto descompromissado como a adolescência, geralmente de rótulos alegres e coloridos. Dá até para imaginar Buzz Lightyear com uma taça na mão vibrando: “To infinity and beyond!”
“A Origem” – No filme de estilo obra em aberto – e que cada um que tire sua conclusão -, Leonardo DiCaprio comanda uma equipe que invade os sonhos de pessoas para roubar de seu inconsciente segredos que possam ser utilizados por empresas concorrentes. O desafio do grupo é a encomenda inédita de invadir a mente de um cliente e implantar uma idéia. O início mais esotérico vai dando espaço a um filme de ação com fundo de drama romântico.
Vinho para acompanhar – Um vinho com uma tese a defender, como os biodinâmicos ou vinhos naturais – aqueles que dispensam a química, pregam um retorno às raízes (às “origens”, sacou?) e se baseiam no respeito aos grandes equilíbrios da natureza – são ao mesmo tempo representantes e antípodas de um universo que mistura os sonhos e a tecnologia, foco do roteiro de A Origem. Mas cá entre nós, os grandes representantes dos “bio” dariam um naco de seu vinhedo para entrar na mente dos consumidores e implantar a idéia da pureza e da superioridade de seus vinhos, né não?
“O Discurso do Rei” – A história é baseada na vida de George VI, rei da Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundial, e seus esforços para superar a gagueira auxiliado por um terapeuta da fala de métodos pouco ortodoxos. O tema não parece ser muito empolgante, mas o filme de roteiro bem construído e interpretações afinadas tem seu favoritismo na premiação do Oscar.
Vinho para acompanhar – Nada mais britânico que um vinho do Porto, uma intervenção dos ingleses em solo português. Um filme tradicional como O Discurso do Rei exige um Porto Vintage de marcas que mostram a influência do Império Britânico até no rótulo, como Taylor’s, Dow’s, Niepoort, Warre’s e Sanderman. Um fortificado de sabor concentrado, requintado e elegante.
“O Vencedor” – O filme é baseado na história do campeão mundial de boxe Micky Ward e de seu irmão Dicky, um ex-boxeador viciado em crack. Dicky imagina que está sendo filmado para um documentário sobre seu retorno aos ringues, quando na verdade o objetivo é flagrar seu vício no crack.
Vinho para acompanhar – Filme de luta exige um vinho de musculatura, uva de macho. Um tannat uruguaio, com taninos presentes, que exigem carne gordurosa como acompanhamento, é o parceiro recomendado entre um golpe e outro dos pugilistas.
“127 Horas” – A produção narra a história real do alpinista americano Aron Ralston, que precisou arrancar o próprio braço com um objeto cortante para se livrar de uma rocha que o prendeu por mais de cinco dias no Bluejohn Canyon.
Vinho para acompanhar –127 horas é um filme de deserto, muita rocha, seco, afiado e com uma tensão permanente. Um branco da uva riesling seco, de preferência alemão, corta como navalha, tem uma acidez presente, cítricos no nariz, um leve picante na boca. Além de todas estas características, trata-se de um fermentado com grande expressão de mineralidade, a pedra que se revela no vinho.
“Minhas Mães e Meu Pai” – A comédia azarão da festa traz Annette Bening e Julianne Moore como um casal de lésbicas cujos filhos buscam o pai biológico, um retrato bem-humorado das variações das famílias contemporâneas.
Vinho para acompanhar – O filme mais leve da premiação – com exceção do infantil Toy Story 3 – é de temática gay. Não há bebida mais gay do que um espumante rosé, que reúne a festa das borbulhas com a exuberância da cor e o frescor dos aromas frutados. Um flute de espumante rosé para Minhas Mães e Meu Pai é a homenagem perfeita.
“Inverno da Alma” – A história gira em torno de uma família desestruturada em busca do pai desaparecido. A adolescente Ree, de 17 anos, tem responsabilidades de chefe de família. Com uma irmã e irmão pequenos, e a mãe com problemas mentais, ela é responsável por colocar comida na mesa e resolver problemas deixados pelo pai foragido. Para piorar a situação, o pai coloca a casa, localizada nas geladas montanhas do Missouri, como garantia de fiança de uma pena judicial. Ree enfrenta a barra e sai à procura do pai-problema e no caminho é desafiada a se confrontar com o passado da família e encarar as regras e a ética próprias da comunidade local.
Vinho para acompanhar – O inverno na alma do titulo se refere tanto ao frio das montanhas, que exige sempre um gorro de lã na personagem principal, como à angústia que passa uma adolescente que carrega o peso das obrigações de uma mulher adulta. A indicação do vinho por similiaridade aponta para um icewine do Canadá. O icewine é um branco doce, de baixo teor alcoólico, elaborado com uvas colhidas congeladas. A bebida, servida em temperatura de 8 graus, remete ao cenário do filme. A boca untuosa e o sabor forte do vinho, com um toque de mel, são forjados pelo frio. Frio da natureza, o frio da alma.
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Este colunista não é especialista em cinema, mas tem suas preferências. Talvez comece o show com um chardonnay amadeirado, seguido de um bom Borgonha. Mas não vai ficar triste em terminar a noite com uma taça de Beaujolais Nouveau.
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O champagne de pinot noir não seria “Blanc de noir”?
certíssimo, estou corrigindo
abs
Excelente post, ocncordo com cada combinação, só o discurso do rei que não assisti ainda, irei testar com um excelente vinho do porto que tenho guardado.
Parabéns!
Supertexto! Muito bom! Interessante! Parabéns!
Caro Gerosa,
Você viu o vídeo da degustação às cegas, feita na França, com Haut-Brion, Petrus, Mouton, Ausone e todos os top de Bordeaux ?
Se puder, dê uma olhada no meu blog que postei lá (surpreendente):
http://www.decantandoavida.com/index.php?option=com_content&view=article&id=401:as-cegas-tudo-fica-as-claras&catid=1:artigos-posts
Um abraço
Eugênio Oliveira
Caro Eugênio
Não conhecia o vídeo. Bem interessante. Eu costumo dizer que degustação às cegas é a prova dos noves. Torna qualquer especialista esnobe em um humilde aprendiz.
Só me incomoda aquele início, acusando as grandes revistas do ramo de não mostrar “este tipo de degustação” por que são financiadas pelos grandes empresas. Dispensável. O que vale ali a avaliação às cegas de grandes vinhos – e o mais barato de todos, de 14 euros, bater outros de até 1.000 euros.Enfim o que vale é o que está na taça.
Grande abraço
O melhor de tudo é que só o vinho e a cerveja são bebidas alcoólicas que trazem benefícios à saúde… mas nada com um bom vinho!
Juliana http://nutrindopordentroeporfora.blogspot.com/
Um espumante rosé com “minhas mães e meu pai” , muito legal.
Gostei muito. Obrigado.
http://www.nwmidia.com.br
Prefio um espumante rosé combinando com o filme vencedor de oscar “Minhas mães e meu pai”, é suave e gostoso.
Obrigado.
http://www.nwmidia.com.br
Amei a postagem sobre o último dia de vida de seu cão Puppy. Só quem ama realmente os animais consegue expôr um sentimento tão verdadeiro. Podemos dizer que a única amizade verdadeira nos tempos atuais é a amizade de um animal, seja um cão, gato, cavalo, golfinho e tantos outros animais que entregam a nós um sentimento tão puro e verdadeiro.
Parabéns pela homenagem destinada a seu grande amigo.