Ok, todo mundo sabe diferenciar ficção de realidade. Ou não? A Vinícola Vieira Braga não existe, muito menos um sommelier tão intenso quando o personagem de Cauê Reymond. Mas como este Blog do Vinho já havia mostrado no último post, os vinhedos e vinícolas do Vale do Rio São Francisco são de verdade.
A minissérie Amores Roubados criou uma expectativa inicial no mundo do vinho (críticos, produtores, blogueiros e amantes da bebida) que se transformou rapidamente numa visão crítica do roteiro, apontando falhas aqui e ali na descrição dos tintos e espumantes (é divertido entre o pequeno mundinho, mas fora do círculo perde a graça). O vinho, e principalmente a região, é apenas um pano de fundo, e as informações e diálogos têm de servir à história, ajudar na construção dos personagens, e não se intrometer na minissérie como um telecurso de vinho. Trata-se de uma história de amor e traição. O vinho é uma moldura.
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Mas mesmo assim, a força que a TV aberta (leia-se Globo) ainda tem no Brasil trouxe à tona os vinhedos e principalmente os vinhos do sertão. “Independentemente da história, a minissérie mostra que no Vale do São Francisco, em pleno sertão, é possível produzir coisas maravilhosas”, defende Ricardo Henriques, enólogo da Vitivinícola Santa Maria, a ViniBrasil, onde foi gravada a série. “Muita gente ainda não faz nem ideia de que aqui se faz vinho”. “Além disso, coloca em destaque o vinho, auxiliando na desmistificação da bebida.”, acrescenta Gabriela Zenatto Jornada, Supervisora de Marketing Institucional e Comunicação da Miolo Wine Group, proprietária da Fazenda Ouro Verde, que produz o Terranova.
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Entenda as duas safras por ano do Vale do São Francisco
Muitos entendidos e profissionais estranham um pouco esta história de um vinhedo produzir mais de uma safra ao ano. Quem já frequentou algum curso de vinho ou por curiosidade leu mais a fundo sobre o assunto sabe que existe algo chamado ciclo das vinhas, divido em três fases. No Brasil, e hemisfério sul, funciona assim: há um período de repouso, ou hibernação, que ocorre de abril e julho, quando a planta perde as folhas; de agosto a dezembro a planta começa a crescer e florescer e por fim há a colheita, entre dezembro e março, quando as frutas amadurecem. No hemisfério norte as datas são evidentemente opostas: repouso: dezembro a março; crescimento: abril a julho; elaboração e colheita: agosto a novembro. Mas é uma safra só.
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Mas no Vale do São Francisco a história é outra. O enólogo Ricardo Henriques, que é português (o grupo ViniBrasil é português), explica: “Isto deve-se em grande parte à particularidade do clima do Vale do São Francisco, que se resume de forma genérica às seguintes características: 300 dias de sol por ano, temperatura média alta durante todo o ano (o que permite o contínuo desenvolvimento da planta), pluviosidade muito baixa e água para irrigação abundante graças ao “Velho Chico” (Rio São Francisco) . Todos estes fatores combinados permitem que a planta se desenvolva durante todo o ano, não estando condicionada à sazonalidade como em outras regiões tradicionais no mundo. Quem comanda o ciclo da planta é o homem, através da irrigação e nutrição da parreiras; o que acontece é que como não temos o inverno e suas temperaturas baixas que fazem com que a planta sofra o processo de hibernação, podemos controlar o seu ciclo de repouso – através de estudos sabemos que a videira precisa de repousar apenas cerca de 60 dias para acumular energia que lhe permita efetuar um novo ciclo de produção – sendo que o seu ciclo de desenvolvimento varia de 120 a 150 dias dependendo das castas. O seu ciclo de desenvolvimento tem a mesma duração que têm as videiras em outras regiões produtoras quentes, como é no Alentejo (Portugal), Mendoza (Argentina), Maipo (Chile), Toscana (Itália).”. Resumindo, o truque está na diminuição do tempo de repouso.
Em se plantando, tudo dá
E quais as uvas que melhor se adaptaram a este terroir tropical? Para Ricardo Henrique são: touriga nacional, alicante bouschet, cabernet sauvignon, syrah, aragonês (tintas), viognier, arinto, moscato canelli e fernão pires (brancas). “Elas estão bem preparadas para o clima árido e seco do vale e ao mesmo tempo não perdem a sua frescura durante a maturação, o que resulta em vinhos equilibrados e com bastante potencial”, avalia. Já Gabriela Jornada aposta mais no potencial das uvas brancas: “Constantemente fazemos testes com novas variedades tanto para vinhos quanto para espumantes. Podemos dizer que a família das Moscatéis, uvas brancas aromáticas, se adaptaram muito bem a região
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E você, já bebeu um vinho do sertão?
Certo, você já foi convencido que vinhedos no sertão não são uma miragem e até enfrentou um parágrafo para entender como é possível obter mais de uma safra por ano e outro para conhecer as principais uvas. Mas e os vinhos? Afinal, o que distingue os tintos e espumantes do sertão daqueles elaborados em outras regiões do Brasil, em especial no Sul ? Para Gabriela Zenatto Jornada, da Miolo Wine Group, os vinhos da linha Terranova “são mais jovens, frescos e frutados, se comparados aos vinhos mais tradicionais da região sul do Brasil.” Um exemplo desta categoria é o Almadén Syrah. Da linha Rio Sol, da ViniBrasil, os representantes desta ala são os tintos varietais, como o Rio Sol Tempranillo, Syrah e Cabernet Sauvignon.
Ricardo Henriques concorda e acrescenta: “Os espumantes são leves e bastante aromáticos, fugindo do padrão utilizado no sul que se assemelha mais às cavas e champagnes. Os nossos espumantes pretendem ser diferentes, para beber sem complicações”. É o caso do Rio Brut Rosé. O Terranova Moscatel (um espumante de sobremesa de baixo teor alcoólico, elaborado pelo método Asti) é líder de mercado na sua categoria “É a cara do Vale do São Francisco, leve, fresco, frutado e delicadamente doce”, explica Gabriela Jornada.
Mas a região também almeja voos mais altos e mostra todo o seu potencial em ícones tintos, como o Testardi Syrah, eleito o melhor tinto do ano no concurso Top Ten da ExpoVinis 2012, o Paralelo 8 Premium (alicante bouschet, aragonez, cabernet sauvignon, syrah, touriga nacional) e o Vinha Maria Reserva Selecionada (cabernet sauvignon e touriga nacional). São tintos mais potentes, encorpados, resultado de uma maturação da uva mais avançada. Os vinhos passam por estágio em madeira – e deixam isso bem claro no aroma e na boca – e mais um tempo de guarda na garrafa, revelando caldos com bom aroma e boa estrutura.
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Os vinhos e os preços*
- Miolo/Terranova – Fazenda Ouro Verde
Almadén Shiraz: R$ 14,50
Terranova Brut/ Brut Rosé / Moscatel: R$ 25,00
Testardi Syrah: R$ 81,00
- ViniBrasil/Rio Sol – Vinícola Santa Maria
Linha Rio Sol Varietais (cabernet sauvignon e syrah, tempranillo, syrah, cabernet sauvignon): R$ 20,00
Linha espumantes Rio Sol: R$ 25,00
Linha Rio Sol Reserva – R$ 35,00
Linha Rio Sol Winemaker’s Selection (touriga nacional, alicante bouschet, cabernet sauvignon): R$ 45,00
Linha Vinha Maria Reserva Selecionada: R$ 70,00
Paralelo 8 Premium: R$ 90,00
* preços praticados na venda online nos sites da empresa em janeiro de 2014
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Quer conhecer?
O enoturismo é uma fonte de receita importante para as duas vinícolas e uma oportunidade de divulgação do vinho da região. E também um choque para a maioria dos visitantes, surpresos com uma estrutura de adega e vinhedos em pleno sertão. A ViniBrasil recebe cerca de 500 visitantes por mês, 6.000 ao ano. O maior público é composto de brasileiros de outros estados. A Terranova recebe mais de 20.000 visitantes ao ano.
Ficha
- Terra Nova/Miolo/Fazenda Ouro Verde
Onde: Fazenda Ouro Verde, BR 235 km 40, Santana do Sobrado s/n Vale do São Francisco. CEP 43700-000. Casa Nova, Bahia
Desde: 2000
Área cultivada: 200 hectares
Produção: 2 milhões de garrafas por ano
Rótulo mais vendido: Terranova Moscatel
Vinho mais bem avaliado pela crítica: Testardi Syrah
Onde encontrar: lojas e supermercados em todo o Brasil
Vendas on-line: site da Miolo
Enoturismo: página de enoturismo do site
- Vitivinícola Santa Maria/ViniBrasil/Rio Sol
Onde: Fazenda Planaltino, S/N, Zonal Rural 56395-000. Lagoa Grande, Pernambuco
Desde: 2002
Área cultivada: 200 hectares
Produção: 1,5 milhão de garrafas por ano
Rótulos mais vendidos: Rio Sol Brut Rosé e o vinho tinto Rio Sol Cabernet Sauvignon-Syrah.
Vinho mais bem avaliado pela crítica: Vinho Tinto Vinha Maria Reserva Selecionada
Onde encontrar: lojas e supermercados do Brasil (exceção da Região Norte, onde só existe distribuição no Pará)
Vendas on-line: site da e página oficial do Rio Sol no Facebook
Enoturismo: Vitivinícola Santa Maria (clique em Enoturismo no menu principal)
Publicado originalmente em janeiro de 2014
Fico feliz em saber que, o sertão do Brasil, Sertão de um povo tão sofrido e esquecido, produz vinhos tão bons. Fico feliz também pela coragem da Rede Globo em mostrar o potencial do Sertão Brasileiro. Lembrando mais uma vez da velha frase “Nessa terra em si plantando tudo da.
Parabéns ao IG pela publicação da matéria.
A melhor informação,sobre vinhos nacionais; podem crer!…