O que diferencia um Vinho do Porto de um vinho tranquilo é seu caráter doce. Ele é resultado da interrupção da fermentação da uva pela adição da aguardente vínica, o que conserva os açúcares da fruta. Em um vinho tinto ou branco tradicional a fermentação só acaba quando termina, ou seja, o açúcar por meio das leveduras se transforma (quase) todo em álcool.
Mas aquilo que de fato diferencia um Vinho do Porto de um vinho tranquilo é o que o torna sublime, fascinante e inigualável: sua capacidade de melhorar com o tempo. O vinho do Porto pode envelhecer em barricas ou balseiros (os Tawny, por exemplo) ou acompanhar o passar dos anos em garrafas (os Vintages). É aqui que a mágica acontece: o tempo é o senhor da paixão.
Leia também: Porto e comida, por Carlos Cabral
O perfil do Vinho do Porto como conhecemos hoje começou a ser traçado em 1678, quando se tem registro a primeira vez que se adicionou aguardente vínica à bebida. O objetivo era preservar o paladar do vinho que era exportado em navios de carga pois ele perdia parte de sua qualidade durante o trajeto. A casa inglesa mais antiga da região foi fundada em 1670, a Warre & Co. A partir daí os ingleses dominaram o negócio e a produção do vinho fortificado. O nome das casas produtoras que ainda estão atuantes não negam sua origem: Taylor’s, Offley, Graham’s e por aí vai.
O vinho do Porto, segundo definição citada pelo especialista Carlos Cabral em seu livro “Porto, um Vinho e sua Imagem” trata-se de “uma criação portuguesa, uma descoberta inglesa, um patrimônio da humanidade”
Leia também: Conheça os vários tipos de vinhos do Porto
Ruby, Tawny, LBV
Os portos que envelhecem em tonéis ou grandes barricas (balseiros) antes de serem comercializados são os Ruby (2 a 3 anos. Em geral são os vinhos mais simples, baratos e mais vendidos), Late Bottled Vintage – LBV (4 a 6 anos), Colheita, e Tawnys simples e de 10, 20, 30 e 40. Estes últimos são considerados um degrau acima na qualidade dos portos envelhecidos em madeira. Neste caso, as garrafas duram mais tempo depois de abertas. Por isso mesmo têm aquelas tampas capsuladas que facilitam o fechamento.
Leia Também:“Vinhos portugueses: o Dão, o Douro e a dor de dente (parte 1)
Uma indicação de 30 anos em um Tawny, por exemplo, explicita a média de idade dos vinhos misturados dentro da garrafa. Ou seja, ali se juntam vinhos com mais e com menos de 30 anos. Por que isso? Para aportar frescor do vinho mais novo à opulência do mais antigo, trazendo assim um equilíbrio para a bebida e mantendo um estilo de cada idade declarada no rótulo. Os Tawny, em especial de 20 e 40 anos, são os vinhos que eu levaria para uma ilha deserta. A cor de um porto Tawny é um espetáculo à parte: muda do ruby inicial para um tom aloirado, acastanhado (daí o nome tawny). Quanto mais antigo, mais visual será esta transformação. Os aromas de nozes, especiarias e mel também se acentuam. O final de uma taça de um Tawny de 40 anos é algo inebriante.
Porto Vintage
Já o Porto Vintage envelhece a maior parte do tempo em garrafa e tem a longevidade dos períodos históricos. Com alguma liberdade poética é possível dizer que acompanham a aventura do homem e atravessam gerações. Este colunista já teve o privilégio de participar de uma vertical de Vintage muito antigos da Casa Ramos Pinto. Foi em 2011. A prova destes Vintages é a materialização desta narrativa do tempo. Foram servidas as safras 2007, 1983, 1970, 1952, 1934, 1924 e 1884. Meninos, eu bebi história! Imagine o que é provar um vinho engarrafado ainda durante o Brasil Império, antes da abolição da escravatura, ou outro em que o então presidente do Brasil, Arthur Bernardes, enfrentava o tenentismo, ou ainda um vinho do ano em que é declarada a Constituição de 1934 sob o governo Getúlio Vargas. Mesmo em safras mais recentes, 1970 (?!?!), a taça do mundo era nossa!
Os vinhos tinham níveis diferentes de complexidade, cor, aromas, taninos, vivacidade e tudo o mais, claro. Mas estavam ali, mostrando a capacidade de enfrentar o tempo e se modificar junto com ele. Mais fascinante: são vinhos que chegaram vivos até nós. Não como peça de museu, mas como uma bebida em condições de ser apreciada e entendida em seu contexto.
Leia Também:“Vinhos portugueses: o Dão, o Douro e a dor de dente (parte 2)
Em recente visita à belíssima casa onde funciona o museu Ramos Pinto, na cidade de Vila Nova de Gaia, em Portugal (quem tiver a oportunidade eu recomendo), tive a oportunidade de provar um Vintage 2005, que expressava muita fruta e potencial de guarda e me fez relembrar esta experiência memorável. Esta é uma das chaves para entender os Vintages, são vinhos longevos, que demandam tempo para mostrar traços de evolução. Mas se são longevos enquanto estão arrolhados, depois de abertos se recomenda que sejam consumidos em no máximo dois dias.
O Vintage é um vinho especial, não é produzido todos os anos. Diz o ditado que os “Tawny são uma obra do enólogo (tem a decisão dos blends e tal) e os Vintage uma obra de Deus (dependem da mamãe natureza)”. É um vinho de uma só colheita (impressa no rótulo da garrafa), selecionado entre os melhores caldos extraídos das melhores parcelas dos vinhedos das casas produtoras de Porto, apenas nas safras excepcionais, aquelas que apresentaram as condições ideais. Uma primeira seleção do vinho destinada a se tornar um Vintage já é uma confirmação do enólogo de que as condições do clima e de colheita apontaram que há coisa boa ali. O caldo fica aguardando em balseiros (grandes barricas) por cerca de dois anos (dois invernos) até ser provado às cegas na primavera seguinte. Se confirmado pelos enólogos o nível de excelência, as melhores parcelas são engarrafadas como um Vintage. No geral amostras do vinho são enviadas para o Instituto do Vinho do Porto que através de critérios estabelecidos de padrão e qualidade declara, ou não, aquela safra da Casa como Vintage.
Os Vintage são o cartão de visitas das casas produtoras do Porto. Em volume representam pouco menos de 5% do mercado. É um vinho caro (no Brasil, muito caro) que funcionam como porta-estandarte de qualidade da casa, e acabam impulsionando o resultado da venda dos outros tipos de Porto do catálogo das casas produtoras. Não é por outra razão que a declaração de Vintage é acompanhada de algum barulho e as casas tratam de tocar bumbo e compartilhar a novidade de todas as formas possíveis, de preferência acompanhada de altas pontuações dos críticos e guias mais influentes do mundo.
Aqui no Brasil a divulgação de parte dos Vintage declarados de 2017 se deu em uma prova coordenada por Fernando Seixas, da The Fladgate Partnership, uma holding de negócios do Vinho do Porto que comercializa as marcas Croft, Fonseca, Krohn e Taylor’s.
Foram apresentados seis rótulos da safra 2017, que trazem a expectativa de repetir a histórica safra de 1945, e ainda mais três Vintages de anos anteriores, como uma prova de sua evolução com a idade, foram eles: Krohn Vintage 2007, Fonseca Vintage 1997, Taylor’s Vintage 1987.
Vale, antes de tudo, estabelecer a seguinte premissa, não há aqui nesta seleção de craques um Vintage que mereça ficar na reserva, são todos titulares e podem jogar em diversas posições. Qualquer destes portos na minha (e na sua) taça fariam o dia e a noite mais plenos e gratificantes. Mas por um critério ou outro a gente acaba elegendo os preferidos (não que isso tenha alguma importância diante de um painel desses). Vale chamar a atenção para o potencial da safra 2017. Para quem queer investir em qualidade e até no mercado. Vai dar o que falar. Vamos aos vinhos, pois:
Vintage 2017 – um ano para se comemorar
CROFT VINTAGE 2017 – A origem da empresa Croft é anterior mesmo ao vinho do Porto, de 1588, quando se estabeleceu na Inglaterra por Henry Thompson. A família Croft se junta à empresa de Thompson em 1736 e a partir daí a casa adota seu nome. A qualidade de seus vinhos está associada à origem de seus vinhedos, localizados na Quinta da Roêda, no Cima Corgo, considerada uma das melhores do Vale do Douro. Um pouco de poesia ajuda a entender o lugar. Para o poeta do século XIX Veiga Cabral “se a região demarcada do Douro fosse um anel de ouro, a Roêda seria seu diamante”. São produzidas 3.900 caixas. É importado pela La Pastina.
O que diz o diretor de enologia David Guimarães: “O 2017 apresenta um caráter sedoso, a voluptuosidade da fruta e os aromas exóticos tão característicos do estilo da casa. No entanto, as condições excepcionais do ano acrescentaram uma notável força e vigor, bem como uma atrativa mineralidade”
O que diz o vinho: Foi o primeiro vinho provado e já trazia características de um vintage clássico. O problema foi que, ladeado por seu primo mais rico, o Sérikos, comentado abaixo, perdeu um pouco o brilho. Poderoso e concentrado na boca, porém foi seguido de um néctar mais impressionante.
CROFT QUINTA DA ROÊDA SÉRIKOS VINTAGE 2017 – No final do século XIX a Croft replantou cerca de 50.000 videiras para substituir aquelas que haviam sido dizimadas pela Filoxera (aquela doença que atingiu os vinhedos da Europa no século XIX) na Quinta da Roêda. A maior parte destas novas videiras foram plantadas nas parcelas conhecidas como Benedita, Ferradura e Galeria, em anfiteatros de xisto (a pedra que domina os solos do Douro) erguidos à mão. Estas três vinhas velhas emblemáticas são a origem deste lançamento: Porto Vintage Sérikos. O nome remete à criação da seda que era feita na Quinta e também traduz a textura sedosa do vinho. São produzidas 2.425 garrafas. A Croft é importado pela La Pastina (não sei se vão trazer este aqui).
O que diz o diretor de enologia David Guimarães: “Se houve um ano em que se pedia um Vintage feito a partir de vinhas velhas da Quinta da Roêda, era este de 2017. O primeiro Sérikos representa a Roêda em toda sua opulência, textura sedosa e qualidade aromática. As vinhas velhas acrescentaram-lhe uma complexidade impressionante e o vinho ganhou uma dimensão e uma profundidade notáveis.”
A voz do vinho: Sensacional. Um Croft clássico turbinado pelas vinhas velhas. Uma explosão nos aromas, muito complexo em boca, uma fruta mais passa. Poucas vezes um nome se encaixa tanto na expressão gustativa de um vinho: sérikos, explicado acima, se traduz como “sedoso”. Vai longe, muito longe. Um lançamento que nasce icônico.
- Leia também: Vinho do Porto Colheita 1937: bebendo história
FONSECA VINTAGE 2017 – Não são só os ingleses os tutores do vinho do Porto. A família Guimarães está há cinco gerações à frente da Casa Fonseca, desde 1815. Os vinhedos estão todos localizados no Cima Corgo. São eles a Quinta do Panascal, Quinta do Cruzeiro e a Quinta de Santo Antonio. A revista Wine Spectator concedeu 97 pontos ao 2017 e recomenda beber entre 2035 e 2060 (estaremos vivos até lá?). Foram produzidas 8.100 caixas e é importado no Brasil pela Decanter.
O que diz o diretor de enologia David Guimarães: “A qualidade da fruta presente no Fonseca 2017 é excepcional. É concentrado e poderoso, com a tradicional opulência e complexidade dos clássicos Fonseca mas com uma atrativa mineralidade. As notas características do ano harmonizam com perfeição como o estilo da casa.”
O que diz o vinho: Elegante. Floral no primeiro impacto, um pouco mais fresco em boca que seus pares de 2017, com as frutas menos doces, que chegam em camadas e tem sim algo que lembra a mineralidade descrita pelo enólogo. Um lorde inglês (apesar de ser um Vintage de uma família portuguesa).
KROHN VINTAGE 2017 – Empresa fundada por dois noruegueses em 1865. Durante muitos anos focou mais a sua produção em vinhos do Porto envelhecidos em madeira (lembra a diferença? Tá explicado lá em cima), como os Tawnys e em especial os Colheita (que é uma espécie de Vintage que vai para a barrica em vez de envelhecer na garrafa). A proposta de lançar um vintage da Krohn é encontrar um novo perfil para a marca. As uvas são provenientes da Quinta do Retiro Novo, próxima do Vale do Rio Torto, no Cima Corgo. A vindima começou antes do habitual, o que resultou em rendimentos baixos, mostos concentrados e cor profunda. Foram produzidas 1.300 caixas. A Krohn é importada pela World Wine.
O que diz o diretor de enologia David Guimarães: “ Estamos perante um vinho maravilhosamente elegante e aromático, mas que representa a estrutura e a concentração típicas deste ano”.
O que diz o vinho: Quando se está junto a uma constelação, algumas estrelas inevitavelmente ficam ofuscadas. O Vintage da Krohn perdeu estatura diante da concorrência, apesar de seus predicados.
.
TAYLOR’S VINTAGE 2017 – Fundada em 1692 a Taylor’s é uma empresa familiar reconhecida por seus Vintages. São três propriedades que fornecem a matéria-prima para o vinho: Quinta da Terra Feita e Quinta do Junco, no Cima Corgo e Quinta das Vargellas, no Douro Superior. É a primeira vez que há uma declaração Vintage em dois anos seguintes pela Taylor’s, 2016 e 2017. São produzidas 11.500 caixas desta beleza que é importada pela Qualimpor.
O que diz o diretor de enologia David Guimarães: “Como é habitual em anos secos, as vinhas e Vargellas produziram resultados magníficos. As uvas fantásticas com os seus bagos maduros, com películas espessas produziram vinhos densos, com estrutura firme, mais contidos nesta fase mas com impressionante profundidade e reserva de aromas. O 2017 e um Taylor’s clássico, delicado na fruta e com características de notas florais”.
O que diz o vinho: Sou um privilegiado (e estou me repetindo aqui), em recente viagem a Portugal tive a oportunidade de provar o Vintage 2017 da Taylor’s em visita à empresa em Vila Nova de Gaia (outro passeio que vale a pena). Ali ele já mostrou sua elegância, força e fragrância. Uma degustação na casa do dono causa uma certa simpatia imediata pelo produto, e a avaliação pode ficar um pouco enviesada. Provado novamente aqui, apenas 10 dias depois, o Taylor’s 2017 continuou impressionando: uma aula de Porto Vintage para desfrutar já, com fruta pura, um floral gostoso, taninos firmes, potência. Tudo perfeito, sem excessos. Um Vintage clássico que deve se enriquecer com o tempo Se tiver de escolher uma garrafa pelo critério de qualidade, valor e potencial de futuro esta é minha aposta e recomendação.
Leia também: Pera Manca: o vinho que descobriu o Brasil
TAYLOR’S QUINTA DE VARGELLAS VINHAS VELHAS 2017 – Em anos excepcionais, como foi 2017, a Taylor’s reserva quatro parcelas de vinhas entre 80 e 120 anos da Quinta de Vargellas para produzir o creme de la creme dos Vintage. Até hoje foram produzidas apenas sete safras de vinhas velhas. Esta é a oitava. Estas parcelas (Polverinho, Renova do Depósito, Renova do Armazém e Gricha) são vindimadas individualmente e não representam mais do que 2% do total da produção da quinta. São produzidas apenas 5.600 garrafas desta preciosidade e por aí já pode imaginar o preço. Importado pela Qualimpor.
O que diz o diretor de enologia David Guimarães: ““Nunca, desde 1945, um dos melhores anos do século XX, uma vindima tinha começado tão precocemente. Como acontece em anos secos, as vinhas mais antigas, com suas extensas raízes e reservas de energia, produzem resultados magníficos. Penso que o Vargellas Vinha Velha 2017 é um exemplo soberbo do que vinhas mais velhas são capazes de produzir. Este vinho tem a densidade e profundidade do Vintage 2017 mas é multidimensional, contribuindo para isso a diversidade de castas resultando numa impressionante complexidade aromática”.
O que diz o vinho: Se o Taylors’ Vintage pode ser comparado a uma sinfonia moderna, aqui temos uma orquestra antiga com um tempo mais lento, com muitas possibilidades de andamento e uma música que vai crescendo no final. As notas aromáticas puxam mais para madeira e cedro, as frutas, no nariz e boca, são mais intensas, frutos pretos e vermelhos no liquidificador. A complexidade está elevada a “n”. O preço também. Talvez por isso mesmo seja um vinho que exija mais sabedoria e estofo financeiro para saborear e descobrir todas suas possibilidades. O tempo também fará deste jovem um adulto pleno e um senhor respeitado.
O Douro em 10 tópicos
1. O Douro, onde nasce o vinho do Porto, é a primeira região demarcada de vinho do Mundo. Foi criada em 1756, por iniciativa do Marques de Pombal, que visava equilibrar o déficit do Estado com a venda do vinho do Porto, que já conquistara um mercado global importante no período. Entre 1757 e 1761 marcos de granito – conhecidos como marcos pombalinos (foto) – foram colocados nos terrenos do Douro para delimitar geograficamente a região.
2. A região do Douro é dividida em três áreas: Baixo Corgo, Cima Corgo e Douro Superior. O Baixo Corgo, mais próximo das cidades, é a região de maior concentração de vinhedos e maior produtividade, com vinhos menos complexos e mais jovens. É a série B do Douro. O Cima Corgo fica acima do Rio Corgo. Com terrenos mais inclinados e clima mais quente concentra vinhos mais famosos. É o Douro Clássico, origem da maioria dos Vinhos do Porto. O Douro Superior é a região mais nova e seca do Douro se estende até a Espanha e tem se revelado o terroir que produz os vinhos de referência da região.
3. A produção de vinhos no Douro guarda muitas tradições. Ainda é comum a pisa das uvas ser realizada com pés descalços em grandes tanques de pedra (conhecidos como lagares). Parece pouco higiênico (bobagem aquilo vai virar álcool, lembra?), mas na verdade é um instrumento perfeito para esmagar as uvas e extrair das cascas todo seu valor fenólico, já que a pisa pé não tritura as sementes, o que resultaria em amargor para o vinho. Trata-se de um trabalho hercúleo que já é substituído em alguns casos por pisadores hidráulicos que simulam a pisada humana com igual eficiência mas menos charme.
Leia também: Vinhos de Portugal: um Pato aqui, um Pato acolá.
4. Desde 2001 o Alto Douro é reconhecido pela Unesco como Patrimônio Mundial da Humanidade. Demorou, eu diria.
5. É no Douro que estão os vinhedos dos vinhos do Porto, mas é em Vila Nova de Gaia, cidade vizinha ao Porto, onde se encontram os grandes armazéns que envelhecem os Portos de marcas mais conhecidas como Taylor’s, Graham’s, Down’s, Warre’s, Symington, Adriano Ramos Pinto, Croft, Kopke, Niepoort, Sandeman, Offley, etc. A razão é histórica e cartorial: até 1982 só era permitido comercializar o vinho do Porto através do entreposto de Gaia, o que obrigava os pequenos produtores a vender sua produção às grandes empresas. A partir de 1986 foi autorizada a exportação do vinho do Porto diretamente da Região Demarcada do Douro (RDD), permitindo que novos players entrassem neste mercado. Mesmo assim Gaia concentra a grande produção, leva a fama e está preparada para receber os turistas. Estando no Porto, é obrigatório visitar uma das grandes casas produtoras e fazer uma degustação dos vinhos.
6. Se Portugal se caracteriza pela variedade e pela mistura de suas uvas nativas, é no Douro que a expressão “tudo junto e misturado” é a mais verdadeira. Muitos dos vinhedos são tão mesclados que os proprietários não se dão ao trabalho de identificar cada espécie plantada. Outros (cada vez mais) fazem um amplo trabalho de pesquisa e classificação de cada videira e as substituem por seus pares para manter a mesma mescla todos os anos.
- Leia também: É um vinho português, com certeza!
7. As principais uvas do vinho do porto são:
Touriga Nacional – É a casta mais famosa, mas não é exclusiva, do Douro, também é muito utilizada na região do Dão. As bagas pequenas e cascas grossas produzem vinhos escuros e concentrados, muito frutado e taninos macios. A touriga nacional dá profundidade, volume e longevidade aos vinhos.
Touriga Francesa – É a casta mais plantada no Douro. Da touriga francesa se obtém vinhos frutados mais discretos mas com uma concentração de aromas florais mais intensos. Os taninos firmes ajudam a dar estrutura ao vinho.
Tinta Roriz – Depois da touriga francesa é a uva de maior volume no Douro. E ao contrário da touriga nacional, suas bagas e cachos são grandes e os rendimentos são mais elevados. A tinta roriz produz vinhos aromáticos e bem estruturados, que desenvolvem grande elegância e complexidade com a idade, muitas vezes aportando notas de resina e especiarias ao vinho.
Tinta Barroca – A casta produz vinhos perfumados, doces, macios e redondos na boca. As uvas são mais ricas em antocianinas do que em taninos, ou seja, têm mais cor do que estrutura. É uma uva que carece de uma parceria com outra variedade que tenha maior tanino.
Tinto Cão – Uma das variedades mais adaptadas ao clima quente e seco do Douro e também a menos plantada. As pequenas bagas e cachos compactos produzem vinhos de guarda com acidez fresca, textura aveludada, que afinam com o tempo.
Tinta Amarela – Esta variedade é mais plantada nos vinhedos de vinhas velhas. Tem maturação precoce. Seus cachos compactos dão vinhos muito ricos em cor, de aroma intenso e com potencial de envelhecimento. A uva tinta amarela aporta aromas de cereja, amora e um floral de violeta.
8. Falar de Douro é falar de xisto, o tipo de pedra de característica laminada que predomina no solo dos melhores vinhedos e que tem capacidade de absorver água e manter o solo úmido nos dias secos além de reter e irradiar o calor e dar um caráter único aos vinhos da região. O xisto também é usado na formação dos muros dos deslumbrantes terraços de vinhedos que se equilibram em torno do Rio Douro.
9. Álcool vínico, licor de tiragem, aguardente vínica – A aguardente, como já foi explicado, é o método usado para estancar a fermentação e dá a doçura ao Vinho do Porto. Ela é colocada numa proporção média de 115 litros de aguardente para 435 litros de mosto. Ou seja, um quinto do Vinho do Porto leva aguardente, por isso o grau alcóolico costuma ser alto, em torno de 18%. Ela pode ser comprada ou produzida na própria casa. Antes de 1986 era obrigatória que fosse aquela fornecida pelo Estado. Hoje a decisão é da Casa. Atualmente alguns produtores compram aguardentes francesas, como da região de Armagnac.
10. Muito se fala da harmonização dos Portos com sobremesas, chocolates, queijos, frutos secos, queijos mais fortes e até charutos. Ok, tudo isso funciona e tem um estilo que combina mais do que outro com este tipo de comida. A harmonização deve melhorar a experiência, jamais limitá-la. Mas na minha modesta opinião um Porto Tawny, um Colheita e principalmente um Vintage harmonizam com eles próprios. É um vinho sublime para bebericar à capela, um vinho de contemplação, para acompanhar uma conversa boa. Bora lá provar um?
- Leia também: Bacalhau e vinho: tinto ou branco?
Texto incrível, não dá vontade de parar de ler, se tivesse mais 100 “páginas” leria com a mesma admiração como li todo texto.
Sou apaixonado por vinho do porto, principalmente os vintages. Meu sonho é conhecer o Douro e a Vila Nova de Gaia. Parabéns Beto Gerosa pelo artigo incrível com tanta riqueza de detalhes.
Obrigado Eucides pelo seu comentário. Dá até vontade de escrever um livro de 100 páginas sobre o tema.
O Douro é uma viagem que vale o investimento, até mesmo para quem não é apreciador de vinhos. Em sendo então, é o paraíso na terra.
Volto sempre e obrigado mais uma vez
Beto Gerosa
Tema muito interessante, o que aconselharia para quem está a começar neste mundo agora?
Cumprimentos
dourowines
Excelente artigo sobre o Vinho do Porto! É perfeito para conhecer um pouco mais sobre este vinho tão português. Obrigada por este momento!
Continuação de um bom trabalho! Parabéns!
Obrigado pelo incentivo. Volte mais vezes. abraços
Um artigo excelente, cheio de história e sabedoria. Foi, de facto, muito interessante de ler. Muito Obrigada!
Obrigado, Maria, por sua participação e leitura. Volte sempre.
Abraços
Beto Gerosa