Vinho do Zé, do João, da Maria, da Helena, o vinho de toda a moçada. Esta é a ambição da Ambev ao lançar no mercado um rótulo com sua marca, de preço acessível (R$ 39,90) e fácil de beber. Em uma parceria com a Vinícola Miolo, a gigante do setor de bebidas disponibilizou exclusivamente em seu aplicativo Zé Delivery seu vinho em três versões: tinto, branco e rosé.
Nove entre dez especialistas do mercado de vinho são unânimes no diagnóstico de que para elevar o consumo da bebida no Brasil é preciso crescer a base da pirâmide do consumo, com vinhos mais acessíveis e de qualidade em seu nicho. Aquele único especialista que discorda desta tese permanece bebendo seu Champagne safrado em sua torre de marfim, em algum restaurante estrelado.
A notícia de que a Ambev está apostando neste público é um bom sinal para todo mundo. Tem aquele tipo de consumidor que vai se satisfazer com o estilo do Vinho do Zé e continuar feliz da vida abrindo suas garrafas; há aqueles que vão ser fisgados pela bebida e começar a buscar também outros estilos, novas regiões, e até arriscar a desembolsar uma grana a mais em um vinho diferente. Assim funciona com todo mundo, com exceção do nosso amigo na torre de marfim que bebeu Borgonha na mamadeira e quando é oferecido um gole de um vinho do dia a dia arregala os olhos e fecha a boca.
O Zé Entrega
Navegam pela plataforma do Zé Delivery mais de 4,8 milhões de usuários que podem escolher mais de 3.000 produtos como cervejas, vinhos, não alcoólicos, sucos, destilados, petiscos e até itens de churrasco, como carvão e carnes. A Ambev não divulga qual a participação do vinho na fatia de pizza das vendas, mas a diversificação é parte clara da estratégia da empresa e o lançamento do Vinho do Zé reforça este caminho. “Há algum tempo a categoria de vinhos vem ganhando um espaço importante no carrinho de compras no nosso app e, observando essa tendência, resolvemos realizar um estudo junto aos nossos consumidores para entender melhor seus hábitos, preferências e forma de interagir com o mundo do vinho”, informa Frederico Zillig, gerente de Inovação e Produtos de MATCH. Neste momento, o Vinho do Zé está disponível na capital de São Paulo, mas em breve deve ser oferecido em outras praças.
O projeto foi criado em conjunto entre Zé Delivery, pela área de Future Beverages, e a vinícola Miolo. “Identificamos que havia uma oportunidade para criarmos nosso próprio rótulo para ajudar a descomplicar uma categoria que ainda era vista com muitas barreiras”, explica Zillig
Vinho nacional
A escolha de um produto nacional para inaugurar a marca Zé do Vinho tem uma explicação: “Mostrar a brasilidade que é encontrada no DNA do Zé”. Beleza, é um bom ponto de partida. Por isso mesmo causa alguma estranheza a ausência de um espumante na linha, considerando que este é o tipo de vinho mais consagrado e respeitado do Brasil. Sem assumir qualquer compromisso, a Ambev abre a possibilidade de acrescentar novos rótulos à linha, como espumantes. Mas vai depender do interesse dos clientes: “Queremos aprender mais sobre o mercado e atender a demanda dos nossos consumidores”, justifica Zilli.
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Além de serem vinhos brasileiros, outra característica desta linha chama atenção. Os três rótulos são bivarietais, ou seja, mistura de duas variedades de uva, e de duas regiões diferentes – Vale do São Francisco, na Bahia, e Serra Gaúcha, no Rio Grande Sul. Regiões onde a Miolo possui vinhedos. “Essas localidades e suas características interferem no perfil dos vinhos e fazem a combinação perfeita dos extremos do país em um produto único”, argumenta Zillig.
Não deixa de ser uma representação da diversidade que forma o Brasil e os brasileiros. E um bom apelo de marketing também. Uma mistura da água de coco com o chimarrão, do axé com o vanerão, do frio com o calor. E, para colocar um pouco de especiarias e taninos nesta composição, um blend do petismo baiano (72% de votos em Lula) e do bolsonarismo gaúcho (56,35% de votos em Bolsonaro). Em um país dividido politicamente, um vinho pelo menos escapa do sectarismo ideológico e faz um assemblage de divergentes. Beber vinho, afinal, não depende de partido. Ou não deveria depender.
Zé Tinto, Branco e Rosé
Desde o rótulo, com design descontraído e colorido, até contrarótulo, com indicações que sugerem brindes “perfeitos para todos os rolês”, e com um nome popular e nacional, o Vinho do Zé tem uma proposta clara: ampliar o público do vinho e entregar a bebida que ele deseja por um preço mais acessível.
O Vinho do Zé Tinto é elaborado pela cabernet sauvignon da Serra Gaúcha e pela syrah do Vale do São Franciso. Dentro da lógica de ser um vinho fácil de beber apresenta um saudável teor alcoólico de 12,5% e um boca mais macia. Um tinto que não precisa estar associado ao churrasco.
O Vinho do Zé Branco entra naquela categoria de meio seco e traz na composição a pinot grigio da Campanha Gaúcha e a chenin blanc do Vale do São Francisco. Tem um nariz mais discreto, o que é bom, bem fresco no início do gole e um toque mais doce no final. Funciona melhor para dias quentes, de aperitivo. 11,5% de grau alcóolico dão leveza em boca.
O Vinho do Zé Rosé também é classificado de meio seco e é fruto da mistura das uvas cabernet sauvignon da Serra Gaúcha e tempranillo do Vale do São Francisco. Um rosé de coloração mais clara, com toque de frutas vermelhas frescas, bem discreto, também com dulçor bem presente no final de boca.
O dulçor dos Vinhos do Zé, em especial dos dois vinhos classificados como meio-seco, vai de encontro com a pesquisa realizada entre os consumidores. “Nós aprendemos muito com nossos processos de teste com o consumidor, como ele se relaciona com a categoria de formas distintas”, relata o diretor de marketing. Segundo ele, este dulçor percebido nos vinhos, que no geral a crítica e os especialistas abominam, é “adequado aos varietais escolhidos para o corte, ressaltando assim características organolépticas de cada vinho, independente da categoria e classificação”. Traduzindo: as pesquisas apontaram que o consumidor do Zé Delivery prefere uma bebida mais doce.
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Mui amigos
Não é a primeira incursão da Ambev em um rótulo exclusivo. Há acordos com o clube de vinhos Wine, e com a Dante Robino, que pertence à Ambev na Argentina. No final de 2022, em uma parceria entre a Buenos Vinhos, de Galvão Bueno, e a Dante Robino, a empresa lançou em plena Copa do Mundo o tinto Bien Amigos. A ideia era ultrapassar a rivalidade entre o Brasil e a Argentina e mostrar uma união dos inimigos do futebol por meio do vinho. A merlot representava a seleção verde-amarela e a malbec a camisa azul celeste e branca. Como estratégia de marketing digamos que foi uma aposta bem arriscada. O fim da história todo mundo sabe, o Brasil desclassificado, a Argentina campeã. E o Bien Amigos ganhou um sinal de reticências na sua divulgação: Bien… Amigos. Era um tinto bem agradável na sua faixa de preço e proposta, mas a ideia de uma união sul-americana de Baco usando o futebol foi uma bola fora. Não se acerta sempre…