Estou sempre disposto a aprender,
mas nem sempre gosto que me ensinem.
Winston Churchill
Um tinto elaborado com a uva cabernet franc, engarrafado num vasilhame de formato bordalês, etiquetado com um rótulo idêntico ao Romanée-Conti, elaborado por um americano no Brasil e com nome de estadista inglês. Contando assim, parece mentira. Mas este vinho existe. Trata-se do Churchill Cabernet Franc 2006, um vinho potente, amadeirado, com um tostado no estilo dos tintos do Napa Valley, da Califórnia, com muita fruta madura e de baixíssima produção (só 600 garrafas).
Propagada de forma viral, a safra de 2006 foi bastante comentada entre os poucos que tomaram seus goles. 2007 não teve. Para 2008 serão cerca de 1500 garrafas. Ainda é um universo pequeno, mas são estes achados que fazem o charme dos caçadores de novidades brancas e tintas. Para quem está sempre aberto a aprender, mas ao contrário do Churchill estadista aceita um sugestão com gosto, é uma boa aposta. Principalmente se o perfil dos tintos californianos for a sua praia.
Para apresentar a criatura, nada melhor do que o criador. O Blog do Vinho, depois de provar o vinho, foi ouvir o produtor. Com a palavra, Mr. Nathan J. Churchill:
Como surgiu a ideia de produzir um vinho no Brasil?
A ideia de investir no vinho brasileiro surgiu pelo contato e amizade com a Valmarino, eles têm um produto excelente, e ofereceram um pouco de seu vinho para eu experimentar com o uso de barricas.
Por que escolheu a uva cabernet franc?
O cabernet franc é uma uva tinta que se dá bem no Brasil, principalmente em Bento Gonçalves e particularmente em Pinto Bandeira, onde fica a vinícola Valmarino, do meu amigo e colaborador Marco Antônio Salton. Tive acesso a este vinho, estava muito bom, e achei que seria diferente. A uva já foi mais comum no Brasil, e acho que deveria ser mais explorada. Os cabernet franc da Valmarino consistentemente recebem as melhores notas no Brasil.
Quantas garrafas você produziu?
Foram produzidas duas barricas de vinho, portanto 600 garrafas. 2006 foi o primeiro ano. Ainda restam umas 200 garrafas (em São Paulo é vendida pela Enoteca Saint VinSaint). 2007 não houve. Para 2008 aumentei a produção para cinco barricas (1500 garrafas). O Churchill 2008 está há dois meses na barrica e está evoluindo bem, com bastante café e toffee. As barricas do 2008 são de 36 meses de secagem enquanto as do 2006 foram de 24 meses. A tostagem foi a mesma. A uva também. A nova vinificação do Marco Antônio, porém, proporcionou mais fruta.
Como funciona sua parceria com a Valmarino?
O Marco Antônio faz o vinho e me cede uma quantidade para elaborar nas minhas barricas. Eu não participo no cultivo. O processo de vinificação é feito na Valmarino. Para a safra 2006 o Marco Antônio adquiriu um novo tipo de tanque fermentador (de alta tecnologia) que dá resultados ainda melhores. Toda esta parte é feito pelo Marco.
O uso da madeira é muito marcante no Churchill. Era esta mesma a intenção?
O vinho Churchill surgiu de duas coisas. A primeira era minha frustração com o uso de barricas pelas vinícolas no Brasil. Minha empresa representa umas das mais conceituadas tonelarias do mundo, a Taransaud, e como vendedor de barricas eu sabia quanto agrega a barrica ao vinho. Em termos simples, a barrica aumenta exponencialmente a complexidade e qualidade do vinho. Por isso, praticamente todos vinhos top a nível mundial passam por barricas novas. Porém, no Brasil a prática de usar barricas novas não é usual – são sempre poucas barricas, misturadas com as de vários usos, para muito vinho. Eu queria ver pessoalmente se a barrica usada de forma “correta” faria também uma grande diferença no vinho brasileiro. Fiquei feliz em comprovar que a barrica faz a sua mágica aqui também.
A segunda coisa que eu queria comprovar ou verificar era o uso do carvalho americano no vinho. A Taransaud tem uma subsidiaria, a Canton, em Kentucky, EUA, que fabrica barricas exclusivamente com carvalho americano. A Canton usa a mesma técnica tradicional de secagem da madeira que a matriz na França (36 meses ao ar livre). O que se descobre é que o carvalho americano, que é mal visto no Brasil, quando bem trabalhado proporciona excelentes resultados (a um custo muito menor, diga-se de passagem).
O senhor esperava a crítica positiva que o vinho teve?
Quando provei a primeira garrafa eu achava que o vinho era bom. Fiquei muito surpreso e feliz com o entusiasmo nas degustações na SBAV (Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho) e depois em outras aonde o Churchill foi considerado o melhor vinho. Tenho muita sorte de trabalhar com o Marco Antônio, que me dá um excepcional vinho base para fazer a élevage nas minhas barricas.
É inegável que o rótulo do Churchill é uma referência à etiqueta do Romanée-Conti (veja fotos acima). Foi proposital?
Pois é… a ideia original era usar uma arte de um designer, porém ele estava com a agenda cheia e não pôde fazer um desenho para mim. Portanto, tive de fazer eu, e como sempre admirei os rótulos da Romanée-Conti, La Tache e seus companheiros (leia entrevista com o produtor Aubert de Villaine ), resolvi fazer algo parecido. Para 2008 o rótulo vai mudar um pouco. Para melhor, espero.
O Churchill é um vinho de guarda?
Pergunta difícil. Preparei o vinho para ser guardado. Como eu não sabia se iria vender ou se ficaria com 600 garrafas para meu próprio consumo, utilizei uma rolha especial para vinhos de guarda: a rolha francesa Diam (100% isento de TCA). Gostaria de ter utilizado o screw-cap de alumínio, porém não existem garrafas no Brasil para esta embalagem.
A evolução depois de 15 meses na garrafa tem sido muito positiva. O veredicto sobre a guarda do cabernet franc é dividido. Alguns franceses melhoram, enquanto uns californianos nem tanto. Eu não recomendaria guardar o Churchill por muito tempo em altas temperaturas (fora de uma adega climatizada), porém, a uns 14 graus acredito que vai continuar melhorando até 2012. O tempo dirá. O vinho está muito bom agora. Se fizer um churrasco, recomendo tomar em vez de guardar.
Por que o preço inicial da garrafa, 32 reais, aumentou para cerca de 68 reais?
Gostaria que o preço fosse mais baixo, porém se tivesse deixado no preço original teria vendido todas as 600 garrafas na primeira semana.
Qual sua avaliação do vinho nacional?
O Brasil é um lugar ideal para produzir vinhos excepcionais e únicos, exatamente por ser fora da rota de exportação de vinhos globalizados. Como nós não exportamos muito, não temos sofrido pressão para fazer um vinho que agrada ao consumidor americano, inglês ou holandês. É um dos poucos lugares aonde ainda existem vinhos autênticos. E temos também o nosso terroir. O produtores brasileiros são verdadeiros heróis, pois os insumos custam o dobro do preço mundial, fora outras complicações de todo tipo.
Há excelentes vinhos aqui, principalmente aqueles de Bento Gonçalves e da serra Santa Catarinense. Gosto dos vinhos da Valmarino, Salton, Villa Francioni. Acho que o 130 da Valduga é o melhor espumante nacional.
O espumante é mesmo o melhor vinho brasileiro?
O Brasil tem uma vocação natural para espumantes. O clima favorece tanto a produção das uvas como o consumo do vinho em si. A meu ver, os espumantes do Brasil só perdem para os franceses (champagne).
É uma oportunidade fantástica. O espumante pode ser tomado no calor que é muito refrescante, e já existe o hábito do balde de gelo à mesa com a cerveja.Com um pouco de marketing tem tudo para crescer muito.
E os tintos verde-amarelos?
Quanto aos tintos, não é fácil. Algumas safras são boas e outras mais complicadas. As boas estão se tornando mais comuns, talvez pelas mudanças climáticas.
Conte-me um pouco sobre o senhor.
Sou norte-americano e resido continuamente no Brasil desde 1987. O nome Churchill vem da Inglaterra, porém minha família está há 13 gerações nos EUA. Antes de chegarem na Inglaterra, os Churchills vieram da França. Conheço razoavelmente bem Napa (Califórnia) devido a alguns projetos que tive lá. Admiro muito o vinho americano. Embora caro, a qualidade é alta.
Seu amigos americanos já provaram o Churchill?
Sim, meus amigos e família já provaram o Churchill. Quase todos gostaram, com a exceção da minha mãe.
(Nota deste blog: espero que a safra 2008 agrade a mãe de Nathan Churchill: crítica negativa de mãe ninguém merece, não é não?)
Conheço a Valmarino e realmente tem vinhos excelentes. O Cabernet Franc 2005 deles é o melhor.Pinto Bandeira é uma estradinha escondida no Vale dos Vinhedos, mas que vale a visita. Valmarino é quase a última, mas vale a visita.
Nada a comentar só curiosidade de quem gosta muito de vinhos. Onde comprar um Churchill? Voces atnderiamum pedido feito cá de Recife-Pernambuco?
ótimo
Tive a oportunidade de provar este vinho. Realmente, me surpreendeu. Talvez o melhor vinho brasileiro…
E aqui em Brasília aonde encontro ? abrs
Nathan, quanto voce quer para me mandar uma garrafa para Miami? E uma caixa?
Concordo muito com o Nathan. No Brasil há bons vinhos sim, mas como o hábito de beber vinho do brasileiro já é pouco imagina então o hábito de beber vinho brasileiro! E por que tem muita gente que prefere os importados sem conhecer o que temos aqui. Além dos citados pelo Nathan, existem vinhos maravilhosos como o Storia da Casa Valduga, o VF 2004 da Villa Francioni, o Concentus da Pizzato, os mais simples mas bem elaborados da Dal Pizzol, se for para a esfera dos espumantes então nem se fala de tão bons que são! E realmente os produtores nacionais fazem muitos malabarismos para poder produzir seus vinhos pois além das variações climáticas, tudo no nosso país é sobretaxado ao máximo! E quem paga a conta é claro, o consumidor. O vinho deveria ser tratado, como em alguns países, como alimento; com ma
Gerosa,fico feliz não só em ver que você gostou do vinho como que foi além e conversou com o responsável. Parabéns e bons goles nacionais!